No sexto episódio de “Stateless”, ao telefone, de
Camberra, frustrada com o ciclo de notícias negativas, Genevieve (Sarah Peirse)
dá instruções a Clare (Asher Keddie): “Põe o traficante de pessoas nas primeiras
páginas dos jornais antes que aí chegue o comité da indignação. Precisamos de uma
boa história para a imprensa o mais rápido possível!” Na cena, refere-se à iminente
visita de uma comissão para os direitos humanos a um Centro de Instalação
Temporária para detenção de migrantes – como é óbvio, um pesadelo de relações
públicas para o pessoal do SEF nos antípodas! Ah, se ao menos tivesse “Unity” para
serenar os ânimos – “Meus caros requerentes de asilo/ Sabemos que esperam há
muito por um visto humanitário/ Têm de ser pacientes”, ouve-se, em inglês, mal
começa o disco (‘Asylum Seeker’). Mas seria anacrónico: a série baseia-se principalmente
em factos ocorridos em meados da década passada, sonhava Gordon Koang com o fim
das atrocidades no Sudão, encerrado que estava o conflito contra o governo de
Cartum. Aliás, pela região onde se concentram os nueres, era uma altura em que tocava euforicamente o seu thom (um alaúde com o braço em forma de
lira) em casamentos e batizados sem recear que lhe cortassem o pescoço – de
2011, logo após a independência do Sudão do Sul, há no YouTube vídeos de
atuações suas com cerca de 500.000 visualizações. Como se sabe, foi sol de
pouca dura – e como o próprio diria à “ABC”, na Austrália, quando ao fim de um
punhado de anos à espera lá conseguiu asilo: “[Em 2013-2014] Se olhassem para
ti e te vissem com este mapa, matavam-te.” Fazia alusão à característica
escarificação dos seus: normalmente, seis linhas paralelas traçadas na testa
com uma lâmina de barbear, prova de que um jovem pode entrar na vida adulta
antes que lhe apareçam as rugas de expressão. Com a indignação e preocupação
estampadas no rosto, aqui, o maior paradoxo é a absoluta confiança com que se
entrega a uma espécie de beatitude nilótica pelo qual passa a denúncia do tribalismo,
do nepotismo, do saudosismo – cego de nascença e com a família num campo de
refugiados no Uganda, de facto, só tem o futuro a que se agarrar.
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