6 de abril de 2013

Kris Davis “Capricorn Climber” (Clean Feed, 2013)



Na sua “Oxford History of Western Music”, Richard Taruskin recorre à metáfora do icebergue para aludir à informação que, perdida na voragem dos séculos, se vai desprendendo da superfície, afundando-se pelas profundezas rumo ao esquecimento. Uma prática por si referida é a dos tratados de instrução técnico-musical, que indicavam aos instrumentistas como adornar melodias, bordar sequências de acordes, matizar tons, acentuar dinâmicas, introduzir variações, ou seja, interpretar tudo o que as partituras raramente preservam. Taruskin não o diz, mas, na literatura, foi Hemingway que postulou uma ‘teoria do icebergue’ para delinear o processo que permite que os factos concretos flutuem acima da linha de água enquanto a sua simbólica infraestrutura se edifica longe da vista. Entre um autor e outro, é de improvisação – como um princípio que ilude qualquer categorização dogmática – que se fala. E a pianista Kris Davis, neste sétimo disco da Clean Feed com a sua marca – contando com o quarteto RIDD, o trio SKM, o grupo Paradoxical Frog e “Novela”, o álbum de Tony Malaby que orquestrou –, nunca esteve tão próxima de ilustrar estas ideias. Numa invulgar combinação – acompanhada por Mat Maneri na violeta, Trevor Dunn ao contrabaixo e pelo casal Ingrid Laubrock, em saxofone tenor, e Tom Rainey, à bateria – cada uma das suas peças, tão geométrica e matematicamente concebidas quão etérea e hesitantemente esboçadas, navega entre o que se compreende e o que apenas se pressente, num espaço de invenção ora evidente, ora submerso, retalhado por uma sinuosidade linguística e por um discurso vacilante e solipsista, mas também por um assertivo fluxo de intenções e um sistemático jorro de valência coloquial. Parte “Viola in My Life”, se Morton Feldman a tivesse criado para quinteto de jazz, parte, lá está, a comunhão com o desconhecido.

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