Há coisa de dez anos, tinha ele acabado de escrever notas de
apresentação para “Ghana Funk from the 70s”, na Hippo, entrei em contacto com
John Collins, instrumentista, investigador e docente na Universidade do Gana. Trocando
impressões sobre a avalanche de antologias focadas em música ganesa que na
altura atingia o mercado, dizia-lhe que achava extraordinário nenhuma delas
incluir os Edikanfo, dos poucos a terem sido editados na Europa. “É verdade”, respondia-me. “Mas, se reparar, sob esse prisma, a omissão
dos Osibisa será ainda mais escandalosa. Não só, no Gana, se passou a desconfiar
das bandas que se atreveram a combinar ritmos ganeses com rock e soul, como,
também, na Europa, se passou a questionar a honestidade das bandas africanas
que procuraram nos anos 70 e 80 sucesso fora de portas. Sem que o tivessem
chegado a gozar, os Edikanfo, no processo, são um dano colateral.” Realmente. Atente-se
ao paradoxo nestas palavras do empresário Faisal Helwani, antigo ideólogo da
banda, em entrevista à americana “In These Times”, em 2001: “Hoje, no Gana, para
se estar na crista da onda, tem de se ouvir música importada enquanto se segura
um hambúrguer com a mão direita e uma lata de Coca-Cola com a esquerda!” Pois, em
1981, como esse futuro convertido ao purismo fez questão de garantir, bastava
ter-se Brian Eno na cabine – este, por sua vez, via materializar-se a intuição
que o tinha guiado a “My Life in the Bush of Ghosts” (com Byrne): que “na
interação entre o primitivo e o futurista, as ideias mais interessantes eram as
mais antigas”, disse, à “Sounds”. Por sorte, esperava-o em Acra gente que se
sabia na primeira linha – em acã, edikanfo
quer dizer líder – e “The Pace Setters” resulta de uma notável e elementar tomada
de consciência: com Talking Heads à cabeça, de corresponder ao passo em frente
que compensasse os dois que dava atrás quem na época pretendia renovar energias
em solo africano. Conseguiu-o, em teoria, mas o golpe militar que no final do
ano fechou o país impediu-o de o demonstrar na prática – 40 anos depois, é a
covid-19 que mantém os reformados Edikanfo presos em casa de passaporte no
bolso. A ironia.
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