9 de maio de 2020

Enrico Pieranunzi “Frame” (CAM Jazz, 2020)


Com Rosario Giuliani, gravou “Duke’s Dream” (2017); com André Ceccarelli e Diego Imbert, “Monsieur Claude” (2018; consagrado a Debussy); com Gabriele Mirabassi e Gabriele Pieranunzi, o seu irmão, “Play Gerswhin” (2018) – era como se Enrico Pieranunzi, de súbito, e a chegar aos 70, precisasse de repertório alheio para dizer ao que vinha. Mas, entretanto, na realidade, em três títulos exclusivamente dedicados a originais – “New Visions” (2019), “Common View” e “Frame” (ambos deste ano) – dir-se-ia pronto a seguir o conselho que um dia Charlie Parker deu a Art Blakey, caso o baterista quisesse saber mais acerca de si e do mundo: “Ouve com os olhos e vê com os ouvidos.” Saída da boca de Blakey, é uma frase pela qual se dá no livro de entrevistas de Art Taylor, “Notes and Tones” (1977) – o que, por sua vez, podia ser o subtítulo de um disco que no domínio das artes plásticas aponta ao Olimpo pessoal. De facto, aqui, com a sensibilidade à flor da pele, e capaz de trazer à memória um conjunto de belíssimos álbuns a solo lançados em finais de 90, na EGEA, com apontamentos dirigidos igualmente a Gustav Klimt (1862-1918), Henri Matisse (1869-1954), Piet Mondrian (1872-1944), Paul Klee (1879-1940) e Pablo Picasso (1881-1973), Pieranunzi enquadra (como não dizê-lo?) uma série de impressões, ocasionalmente em forma de suíte, extraídas, sobretudo, da contemplação de obras de Edward Hopper (1882-1967), Mark Rothko (1903-1970) e Jackson Pollock (1912-1956). No jazz, não foi o único a fazê-lo: recorde-se que o primeiro registo digno de nota de um tema de saxofone solo se chamou ‘Picasso’ (Coleman Hawkins) – ou, já agora, ‘Flakes – To Mark Rothko’ (Steve Lacy), ‘Les Trois Lagons - d'Après Henri Matisse' (Carla Bley) e 'Paul Klee' (Ivo Perelman, Matthew Shipp e Gerald Cleaver), bem como a escolha de “Luz Branca”, de Pollock, para a capa de “Free Jazz”, de Ornette Coleman”, ou de “Verão”, de Hopper, para “Versuch der Rekonstruktion einer vergangenen Zeit”, de Sven-Ake Johansson e Alexander von Schlippenbach. Ao piano, Pieranunzi traduz os sonhos de uns, os assombros de outros, a sedução e a solidão que em todos havia.

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