17 de outubro de 2020

Catoire: Revived Masterpieces (Challenge, 2020)

Em 1889, frustrado e desiludido com o meio musical moscovita, Georgy Catoire (1861-1926) foi viver para o campo. Fonte de alegria e amargura, como recordação, leva consigo um andamento do seu primeiro quarteto de cordas, em cuja pauta se lê a seguinte apreciação: “Ou muito me engano ou este Andante – com um ou outro lapso formal – foi tecido a partir de um conjunto de peças distintas. É belo, mas ainda se vêem as costuras – Pyotr Ilyich Tchaikovsky.” Incapaz de se desfazer de um documento assinado por tão decisiva figura na sua formação (“Estou maravilhado com o seu talento”, escreveu Tchaikovsky), conservou-o até ao fim dos seus dias, mesmo se decidiu pulverizar o quarteto. Semelhante destino teve um outro quarteto, inventariado como Op. 4, jamais publicado ou, decerto, escutado. Décadas depois, em Moscovo, nos arquivos do Museu da Música, deu-se não só pelo Andante desse quarteto inicial como também com um quinteto que o próprio Catoire adaptou do segundo – estão ambos aqui, em estreia mundial. Daí, um título tão categórico – pois, de um compositor que parecia ter como expoente camerístico o “Trio”, Op. 14 (igualmente neste CD), revela-se agora um par de extraordinárias peças que obriga a rever a música russa do período. De facto, tanto ou mais que Tchaikovsky, o quinteto e o Andante de Catoire têm um polo magnético em Wagner e outro em parte incerta, russa, sim, mas, por isso, e quando comparada à do Grupo dos Cinco, diversamente russa – uma Rússia cosmopolita, germanizada, em que a tradição não fosse simultaneamente ponto de partida e de chegada. Diga-se, a propósito, que se trata de obras que aderem aos princípios da Arte Nova – “Uma linha é uma força tão elementar como as outras. Muitas linhas opostas conjugam muitas forças mais,” disse Henry Van de Velde, algo que a impulsiva, densa, mas fluida e elegante escrita de Catoire traz à memória, como um Rachmaninoff em estado febril. Seja como for, no quinteto, um motivo folclórico congela a ação e sente-se-lhe o pescoço a apertar: o apelo da pátria não tanto o cachecol que conforta quanto a corda que enforca – e nunca dele esteve Catoire tão perto de se livrar.

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