Jerusalem Quartet
Caprichoso programa este, pouco
menos de concetual, em que o Jerusalem Quartet, invariavelmente dado a apáticas
escolhas de repertório, dá asas à imaginação e propõe qualquer coisa como o
quarteto de cordas enquanto drama psicológico. Música para o divã, portanto. Parte
de Smetana, e do seu retrospetivo e obstinadamente autobiográfico “Quarteto de
Cordas Nº 1”, subintitulado “Da Minha Vida”, e chega a Janácek (1854-1928), e
aos seus “Sonata a Kreutzer” – inspirado pela homónima novela de Tolstoi, mas praticamente
uma refutação ao delinquente moralismo do russo (responder-se-á a si própria
mas impõe-se a questão: porque terão surgido argumentos em prol da abstinência
sexual e a justificar o uxoricídio na mente de um pai de treze filhos?) – e “Cartas
Íntimas”, a derradeira dedicatória à musa Kamila Stösslová. A leitura não dista
do naturalismo, algo provinciana mas envaidecida por orgulho regional, de um
classicismo sem nobreza, até, capaz de sugerir que ir de Smetana a Janácek é o
mesmo que dizer que mais se ficará a saber do mundo seguindo um rio da nascente
à foz do que lendo uma enciclopédia de A a Z. Possuem em comum, talvez, a ideia
de que só à luz da resignação se ilumina a existência dos seus autores. Mas
nada mais os limita. Se no primeiro ainda se nota um certo excesso cultural, já
no segundo a aproximação ao dogma parece a denúncia de um arcaísmo. Mas tudo
aqui é tão conclusivo, no entanto, que mal terminam os últimos andamentos se fica
à espera que dobrem os sinos. Há muitas versões destes quartetos (Berg, Lindsays,
Emerson, Talich, etc) e quase todas indicam que a vida é isto – angústia,
ciúme, arrependimento, ilusão. Esta dirige-se aos que foram a tal sorte poupados.
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