Mal se anunciou
“Mirage”, Ellery Eskelin postou a boa-nova no fórum “Sax on the Web”, divulgando
o lançamento e aproveitando para testar as funcionalidades da página no que diz
respeito à alocação de ficheiros áudio distribuídos pela plataforma SoundCloud.
Consuetudinariamente chegaram-lhe mensagens congratulatórias e questionários
acerca do processo de gravação, levantando-se uma dúvida referente à captação
do baixo. O saxofonista esclareceu o forense e lembrou que, naquela
circunstância, partilhava dados no formato MP3, pelo que a qualidade da audição
dependeria do equipamento utilizado na sua reprodução. Quando o seu
interlocutor confessou estar a escutar através dos altifalantes de um portátil,
Eskelin compreendeu o equívoco, desabando: “de certa maneira estamos a regredir
com tanta tecnologia”. O episódio ganha pertinência no contexto da apresentação
de um disco intitulado miragem; e, numa perspetiva mais oblíqua, revela-se oportuno
o seu enquadramento na discussão de um registo – com Eskelin no tenor, Susan
Alcorn na guitarra pedal steel e Michael Formanek ao contrabaixo
– que contraria a teleológica leitura que no horizonte desponta sempre que dá à
costa um trio tão invulgar. Mas a sua evocação é nos dias de hoje eminentemente
apropriada pois permite ilustrar uma distinta característica coetânea a esta época
de progresso técnico e científico, que é a que determina o abismo entre aquilo
que conhecem do mundo a maioria das pessoas e o que sobre a sua disciplina específica
sabe cada um. Dito de outra forma: não só expertos num instrumento se mostram
incapazes de formular uma análise musical como se receia que a crítica de jazz
se prove inábil em louvar o que com o género mantém uma relação vestigial
embora não menos transformativa. “Mirage”, uma fissura para o seu âmago, é essa
obra-prima.
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