A milagrosa
data que reuniu Revis, Davis e Cyrille foi assim descrita pela pianista: “comunicávamos
por emails e o Eric perguntou-me se
estaria interessada em tocar com o Andrew; depois, registámos o álbum quando nos
juntámos pela primeira vez”. O depoimento, sedutoramente facilitista, tomado
por Ethan Iverson – líder nos Bad Plus, blogger
em “Do The Math” e autor das notas de apresentação –, dissimula tanto o empenho
e a disciplina por detrás da sessão quanto as casulosas virtudes dos estúdios
de gravação. E refere-se vagamente ao estado de prontidão enquanto estratégia
de sobrevivência para a vida numa metrópole. O que remete para este título que
alude à Rede Internacional de Cidades de Refúgio – a ONG, derivada do
Parlamento Internacional de Escritores que Rushdie, Banks e Soyinka fundaram em
1994, consagrada ao abrigo de escritores perseguidos. Em setembro de 2012, num trio
com Orrin Evans e Nasheet Waits, Revis contactou com esta realidade ao participar
no “Jazz Poetry Concert” da associação City of Asylum/Pittsburgh, sediada na
Pensilvânia. É por isso apropriado que evoque aqui uma prece – ‘Prayer’, originalmente
um dueto com Charlie Haden, em 1975 incluído em “Death and the Flower” – de um
pianista desse Estado, aí educado por devotos da Igreja de Cristo, Cientista,
que dá pelo nome de Keith Jarrett. Aliás, de certa forma, “City of Asylum”
celebra a espiritualidade dos excêntricos, numa versão de ‘Gallop’s Gallop’, de
um Monk sob a proteção de Nica de Koenigswarter, num tema dedicado ao
ex-escravo Bill Traylor, espécie de Matisse sem a família Stein que pintava,
octogenário e destituído, pelas ruas de Montgomery nos anos 40, ou numa lauda a
Harry Partch, o mais desalinhado dos compositores norte-americanos. O que daí
resulta é ao mesmo tempo terno, revoluto, martirizado (cita São Ciro), redimido
e francamente memorável.
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