Nem
por isso especialmente inspirada, a produção em Adis Abeba do britânico Dan
Harper tornou-se paradigmática ao veicular-se enquanto “Invisible System”. Isto
porque, decerto, não foram incursões de colecionadores nas mais recônditas províncias
do eBay – pelas quais se iam vendendo originais de “Mulatu of Ethiopia” a 500 euros – as responsáveis pelo fomento de um mercado internacional para a música
da Etiópia. Nem tal se ficou inteiramente a dever a “Ethio Jazz & Musique Instrumentale, 1969-1974”, quarto volume da série “Éthiopiques”, em 1998 consagrado
ao trabalho de Astatke. Já a inclusão de três dos seus temas na banda-sonora de
“Broken Flowers”, de Jim Jarmusch, permitiu que, no terreno, logo se
vislumbrassem componentes sistémicos suficientemente integrados para que – de
forma estrutural e comportamental – esse sincrético e individual postulado do
‘ethio jazz’ saísse dos subterrâneos da cultura popular e se convertesse em língua
franca para uma geração empenhada em reorganizar sedes criativas à escala planetária.
Comprova-o a ação conjunta de The Ex em Amesterdão, Krar Collective e
Heliocentrics em Londres, Debo Band em Boston, Bixiga 70 em São Paulo ou Budos
Band e Nicolas Jaar em Nova Iorque, estetas que nessa antiga formulação tão
avessa ao dogma identificaram uma promessa de liberdade para ímpetos expressivos
muito particulares. Trata-se de mais-valia que outras ressurreições – Buena
Vista Social Club, Tom Zé, Orchestre Poly-Rythmo – não chegaram a gerar. E o
que este “Sketches of Ethiopia” agora certifica – contrariando um título plantado
à sombra de Miles Davis e Gil Evans – é ainda mais radical: que o septuagenário
etíope soube expandir a idiossincrasia numa linguagem inesperadamente permeável
ao impacto daqueles que com um novo público a entremearam. E talvez resida aí a
sua derradeira lição.
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