Jordi
Savall (vlag), Ton Koopman (crv), Andrew Lawrence-King (hpa)
Decantações
da arte espanhola do renascimento, estas ricercatas
trazem à memória uma consideração estética de Filipe II, que, em abono da
verdade, já se provou mais anacrónica: “simplicidade na forma, severidade no
conjunto, nobreza sem arrogância, majestade sem ostentação”. Ou seja, se em
pleno siglo de oro isto não é um
programa de austeridade, anda lá perto. E Diego Ortiz sintetizou-o
perfeitamente quando, em Roma, em 1553, dedicando-o ao “Ilustríssimo Senhor D.
Pedro d’Urriés”, viu publicado o seu “Trattado de Glosas Sobre Clausulasy Otros Generos de Puntos en la Musica de Violones”. Talvez
por isso reedite Jordi Savall esta sua gravação de 1989, originalmente lançada
pela Astrée, em que captou a singularidade de uma obra organicamente suspensa
entre o estilo Reis Católicos, ou plateresco, e o herrerianismo; isto é, que partia
da exuberância decorativa para chegar à purificação ornamental. Savall
visitou-a pela primeira vez em 1970, num registo para a Hispavox, e evocou-a em
“La Folia”, em 1998; e outras perspetivas – como a de Bettina Hoffmann, para a
Tactus, subsequentemente antologiada pela Brilliant, ou a de Wieland Kuijken,
para a Regis – têm-na mantido em catálogo. Mas é evidente – cf. em discos de Christina Pluhar ou Daniel Hope – que só algumas das suas 61 páginas têm servido propósitos
demonstrativos, quase sempre ao nível do virtuosismo. Fica agora integralmente restaurada
enquanto uma essencial contribuição para o processo figurativo na música
instrumental dos séculos XVI e XVII, em variações contrapontistas, improvisadas
ou na definição dos baixos contínuo e ostinato,
ganhando aqui – graças a Savall, Koopman, Lawrence-King mas igualmente a Lorenz
Duftschmid,
Paolo Pandolfo ou ao alaudista Rolf Lislevand – uma tão ascética quão
imaginativa interpretação.
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