9 de novembro de 2013

Fauré: Piano Music (Hyperion, 2013)

Angela Hewitt (p)

O programa não podia ser mais genérico: “Música para Piano”. E, no entanto, um primeiro exame, em que de pronto se dá pela ausência de “Barcarolas” ou “Improvisos”, reforça a ideia de que a algum desígnio obedece esta incursão de Angela Hewitt pela obra de Gabriel Fauré. Dada ao eufemismo, a canadiana sublinha o seguinte, no texto em que apresenta o projeto: “É surpreendente verificarmos que, em 1845, o ano em que Fauré nasceu, Schumann estava a completar o “Concerto para Piano”, que Chopin escrevia a sua terceira sonata e que Berlioz planeava a estreia de “Danação de Fausto”; e que, em 1924, quando morreu, já o “Pierrot Lunaire”, de Schoenberg, tinha doze anos”. Dito de outra maneira: se pensarmos que a mais longínqua das peças agora reunidas – a “Balada, Op. 19”, de 1879 – era, digamos, do tempo da guerra entre o Império Britânico e o Reino Zulu, e a que nos está mais próxima – o “Noturno nº 13 em Si menor, Op. 119”, de 1921 – foi contemporânea à atribuição do Nobel da Física a Einstein, percebemos que a pianista se está a preparar para evocar um testemunho de eras que se diriam inconciliáveis. E, de facto, é raro surgir alguém empenhado em desviar o impressionismo daquele modorrento pântano em que se julgaria cativo. Contrariando práticas comuns, Hewitt arrisca uma articulação mais vigorosa, a espaços indolente, nesta música que, ainda que despida do manto do misticismo, evita continuamente a vulgaridade. Aqui, e a leitura de “Tema e Variações, Op. 73” é exemplificativa disso mesmo, Fauré não é responsável por páginas ora excessivamente subsidiárias ora vagamente insubordinadas, mas sim por singulares formulações que indiciam uma progressiva tomada de consciência face a um ponto hoje evidente: apesar de se ter provado mais transitória que definitiva, a produção do francês jamais abdicou da dignidade.

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