16 de março de 2013

Mahler: 9 (Deutsche Grammophon, 2013)



Los Angeles Philharmonic Orchestra, Dudamel, G. (d)

Como se a sua ação pudesse ficar mais mitificada, aí está Gustavo Dudamel a comandar com telúrica dignidade a Orquestra Sinfónica Simón Bolívar no funeral de Hugo Chávez no instante em que chega ao mercado esta gravação, cerca de doze meses após a conclusão do catártico “Projeto Mahler” e pouco mais de dois anos depois de, no centenário da morte do compositor, ter precisamente apresentado em Lisboa a lutuosa “Nona” à frente da Filarmónica de Los Angeles. E o mínimo que se pode dizer é que, nesta transposição do último sopro de Mahler – ou melhor, do seu derradeiro batimento cardíaco, numa altura em que estava já o austríaco consciente da endocardite infeciosa que o consumia –, também ao maestro venezuelano vão faltando as forças à medida que da pauta se extingue a música. Ou isso, ou, o que não surpreende, optou por retirar qualquer deliberação mais definitiva do ‘Adagio’, sublinhando-lhe apenas as ambiguidades – aquele lacrimoso e acrimonioso contraponto entre a pungente redenção e a mais apática resignação, por exemplo – e cristalizando-lhe a perplexidade que ainda inspira. Comparando com os três andamentos prévios, suspeita-se que Dudamel não se interesse por espectros, reservando a energia para ‘Andante’, ‘Ländlers’ e ‘Rondo-Burleske’, nos quais expõe com impecável sentido de oportunidade um caráter dual, tenso, sardónico, que entrincheira dramaticamente numa orquestra tornada campo de batalha entre dois mundos – o velho, provinciano e mesquinho, que escorraçou Mahler, e o novo, vibrante e confuso, que o acolheu – recorrendo a dispositivos praticamente banalizados por décadas de acompanhamento no grande ecrã de cenas de beligerância militar, sentimental e metafísica. Conforme Walter, Bernstein, Maderna ou Rattle, aqui regressará quando decidir lembrar que a terra não é só para os vivos.

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