Los Angeles Philharmonic Orchestra, Dudamel, G.
(d)
Como se a sua ação pudesse ficar
mais mitificada, aí está Gustavo Dudamel a comandar com telúrica dignidade a
Orquestra Sinfónica Simón Bolívar no funeral de Hugo Chávez no instante em que
chega ao mercado esta gravação, cerca de doze meses após a conclusão do
catártico “Projeto Mahler” e pouco mais de dois anos depois de, no centenário
da morte do compositor, ter precisamente apresentado em Lisboa a lutuosa “Nona”
à frente da Filarmónica de Los Angeles. E o mínimo que se pode dizer é que, nesta
transposição do último sopro de Mahler – ou melhor, do seu derradeiro batimento
cardíaco, numa altura em que estava já o austríaco consciente da endocardite infeciosa
que o consumia –, também ao maestro venezuelano vão faltando as forças à medida
que da pauta se extingue a música. Ou isso, ou, o que não surpreende, optou por
retirar qualquer deliberação mais definitiva do ‘Adagio’, sublinhando-lhe
apenas as ambiguidades – aquele lacrimoso e acrimonioso contraponto entre a
pungente redenção e a mais apática resignação, por exemplo – e cristalizando-lhe
a perplexidade que ainda inspira. Comparando com os três andamentos prévios, suspeita-se
que Dudamel não se interesse por espectros, reservando a energia para
‘Andante’, ‘Ländlers’ e ‘Rondo-Burleske’, nos quais expõe com impecável sentido
de oportunidade um caráter dual, tenso, sardónico, que entrincheira dramaticamente
numa orquestra tornada campo de batalha entre dois mundos – o velho, provinciano
e mesquinho, que escorraçou Mahler, e o novo, vibrante e confuso, que o acolheu
– recorrendo a dispositivos praticamente banalizados por décadas de
acompanhamento no grande ecrã de cenas de beligerância militar, sentimental e
metafísica. Conforme Walter, Bernstein, Maderna ou Rattle, aqui regressará
quando decidir lembrar que a terra não é só para os vivos.
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