Richard Bishop faz surf no YouTube. Através de Oum Kalthoum descobre as canções de Mohammed Abdel Wahab ou, em filmes libaneses dos anos 70, encontra a guitarra de Omar Khorshid. Evoca um clássico Club Med dos anos 60 (“Solenzara”), acelera o tunisino “Sidi Mansour” e celebra Fairuz. Veloz como Dick Dale numa onda de caramelo. Acaba a encantar dunas.
Ao sexto álbum, Lura aproxima-se da fonte. E, em parte como consequência da sua acção, descobre-a transformada. Mas chega de sodade. Porque, numa sizígia estética, alinha com gosto canções de Orlando Pantera, B. Leza, Toy Vieira ou Mário Lúcio e, nas mornas, inclina-se formalmente para Teofilo Chantre. O resto é o som de certas esplanadas lisboetas.
Uma Big Band à deriva apela à Rainha do Mar. E, como resposta às preces, a mestiça barca chega à terra prometida. Na travessia socorre-se do Coltrane de “Africa/Brass”, do Hermeto de “Zabumbê-bum-á”, do Don Cherry de “Eternal Rhythm” ou do Fela Kuti de “No Agreement”, temperando exaltação epopeica com a elegância e coerência narrativa de Lins ou Gil.
Na segunda década de independência, subsidiada pelo regime de Moussa Traoré, a música do Mali está em chamas. E à ideia de se partir rumo à identidade perdida sobrepõe-se o desejo de modernização. Electrificam-se tribos, chega-se ao funk dogon, ao r&b mandingo, ao afrobeat cósmico e implodem os mais crus, incendiários e expansivos sons da África Ocidental.
De istmo a canal, elevou-se o ordenamento do território a verdade social. E só quando as relações humanas ganharam fundo nesta roda-dos-ventos estética – cumbia colombiana, mento jamaicano, son cubano ou plena porto-riquenha temperados pelos vapores de Nova Orleães – se preparou terreno para a emancipação. Orgulho na pista de dança com ouvidos no El Bairro.
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