Há coisa de 20 anos, num livro em que aproveitava
para pôr as ideias em ordem, Krzysztof Penderecki sugeria que o ato de compor
se iniciava de modo fenomenologicamente heurístico e que, no fundo, só poderia
evoluir quando se questionassem os princípios subjacentes ao processo criativo
sujeitando hipóteses ao maior número possível de tentativas de refutação,
“sabendo dar com a esperança nos paradoxos do labirinto” – só lhe faltava ter
“A Lógica da Pesquisa Científica” debaixo do braço (Popper).
Em 2014, no
documentário “Paths Through the Labyrinth”, de Anna Schmidt, regressava a esse
símbolo: “Para mim, o labirinto representa essa forma que o artista possui (…)
de chegar indiretamente ao que procura.” E dava corpo à metáfora vagueando solitariamente
pelo prodigioso labirinto de sebes que plantou na parte inferior de uma
arborizada alameda da sua vasta propriedade em Luslawice, uma aldeia no sul da
Polónia. “É tão grande que às vezes até eu me perco nele”, disse, em entrevista
a Oswald Beaujean. “Sempre que escrevo uma peça maior sinto-me às voltas num
labirinto. Sigo em frente, depois para um lado ou para o outro e muitas vezes
tenho de retroceder, em busca de uma saída qualquer.”
Escuta-se a sua música –
mais concretamente, no caso, a “Sonata Nº 2 para Violino e Piano” ou
“Metamorfoses – Concerto para Violino Nº 2” – e, de facto, nenhuma outra imagem
tão bem a ilustra. Noutro domínio, o que logo vem à memória é o que em “O
Jardim dos Caminhos que se Bifurcam” escreveu Borges: “Ts’ui Pên diria uma vez:
Retiro-me para escrever um livro. E outra: Retiro-me para construir um
labirinto. Todos imaginaram duas obras; ninguém pensou que livro e labirinto
eram um único objeto.” Aqui, claro, a protagonista é Anne-Sophie Mutter, em que
Penderecki soube despertar aquele misterioso, abrangente e ferino instinto que
parece ter apenas a ver com a real capacidade de gerar descendência. Nela, precisamente
do período deste “The Early Years”, quando aos 15, 16, 17 anos tocava concertos
de Mozart, Beethoven, Mendelssohn e Bruch como ninguém, reacende-se aquilo pelo
qual deu precocemente Karajan: “Há pessoas assim. A meio metro delas sente-se já
o fogo que têm a arder dentro de si.”
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