Djavan
“Rua dos Amores – Ao Vivo” (Sony, 2014)
Com
swing traçado a regra e esquadro, garante-se
o controlo laboratorial do último de originais, até que de um tubo de ensaio
verte “A manhã me socorreu com flores e aves”, de ‘Asa’, e é novamente 1986. Ou
o tempo de ‘Meu Bem Querer’, ‘Sina’ e ‘Oceano’, em que o público faz ver quem detém
a custódia das canções.
Gilberto
Gil “Gilbertos Samba” (Sony, 2014)
Atento
aos astros, Caetano achava profética a coincidência do nome próprio de Gil com
o apelido artístico de João Gilberto. Agora, diz que “ouvir Gil tocando João é
entrar em contato com toda a aventura de nossa música.” Num jogo de espelhos, eis
‘Doralice’ e ‘O Pato’ e ‘Desafinado’ e o medo do espelho se quebrar.
Paco de Lucía “Canción Andaluza” (Universal, 2014)
Falecido
em fevereiro, Paco de Lucía deixou para trás um álbum que possui qualquer coisa
daquele “verão invencível” de que falava Camus. Consagrado às coplas de Quintero, León e Quiroga que
ouvia Paco em menino, o disco lembra, também, outra coisa que dizia sempre o
seu autor: que “a infância é um destino”.
Tinariwen “Emmaar” (-Anti,
2014)
A
condescendência dos que não distinguem o Sara do Mojave facilita a vida a
tuaregues que editam como quem promove angariações de fundos e compõem a areia
e sangue. Na última digressão por uns gelados EUA, ardia o Azauade e as faíscas
nos seus olhos lembravam o que disse Thoreau sobre criar um verão em pleno inverno.
“The
Real… Bossa Nova” (Sony, 2014)
No
baú há linhos (o Jobim de “Stone Flower”, o João Gilberto de “The Best of Two
Worlds”), algodões (o Miles de “Quiet Nights”), sintéticos (o George Duke de “A
Brazilian Love Affair”) e tecidos por estrear: compactos de Flora Purim e Leny
Andrade e um tema do lendário LP cantado em inglês por Johnny Alf.
“The
Musical Voyages of Marco Polo” - En Chordais, Ensemble Constantinople, Kyriakos
Kalaitzidis (World Village, 2014)
Juntou
o mar ao deserto, estepes a cadeias montanhosas, e, agora, Kalaitzidis vê-o
como um arauto do turismo acidental. Via Marco Polo, eis lamentos do trecento italiano, poesia iraniana do
século XIV, perfumes uzbeques na voz de Nodira Pirmatova, aragens difónicas mongóis
e as cores da rota da seda.
Jean-Louis
Matinier, Marco Ambrosini “Inventio” (ECM, 2014)
Matinier
e Ambrosini passam por Bach, Pergolesi ou Biber e é o Vidal-Folch de “Turistas
del Ideal” que vem à memória. Aliás, provou-o um com Brahem ou Couturier e
outro com Unicorn ou Accentus que, tal como o pelo da raposa, mudam de cor
conforme as estações. Aqui, possuem o tom do barro que cerca o Mediterrâneo.
Kronos Quartet “A Thousand Thoughts” (Nonesuch, 2014)
Para
os neófitos há a “Kronos Explorer Series”, caixa que reúne uma mão-cheia de
clássicos de viagem: “Pieces of Africa”,
“Night Prayers”, “Caravan”, “Nuevo” e “Floodplain”.
E para os há muito convertidos chega este “A Thousand Thoughts”,
assinalando com dez inéditos a indiscrição geográfica do quadragenário
quarteto.
“Piano” - Myung Whun Chung (ECM, 2014)
Será
um oximoro afirmar-se que o maestro aproveita uma primeira oportunidade para gravar
enquanto solista através de “Ao Luar” (Debussy), “Para Elisa” (Beethoven) ou “A
Sonhar” (Schumann)? Talvez não, pois, como dizia Eugénio de Andrade, provém de
um lugar “onde o fogo de um verão muito antigo/ cintila”.
Vivaldi: The Four Seasons – Recomposed by Max Richter
- Daniel Hope, Konzerthaus Kammerorchester Berlin, André de Ridder (Deutsche
Grammophon, 2014)
Tivessem-se
dado as chaves da Igreja de São Roque ou do Palácio Nacional de Mafra a Mies
van der Rohe para uma remodelação e é provável que ¾ dos materiais originais
fossem à vida, que é mais ou menos o que fez Richter com Vivaldi. Para quem
acredita que o verão significa perdermo-nos nos outros.
Al Jarreau “My Old Friend: Celebrating George Duke” (Concord,
2014)
Começa
esta dedicação e logo se ouve “ainda recordo aqueles cálidos dias”. Depois vem
‘Summer Breezin’’ e o cantor parece evocar o Keats de “antes fôssemos como
borboletas, e vivêssemos apenas três dias de verão”. Consigo estão: Patrice
Rushen, Stanley Clarke, Marcus Miller ou Lenny Castro. Dia 18 vai ao CCB.
Lina Nyberg “The Sirenades” (Hoob, 2014)
Algures
entre a Carla Bley de “Escalator Over the Hill” e uma Annette Peacock dedicada à
Off-Broadway, a cantora e compositora sueca, recorrendo à Norrbotten Big Band,
sugere uma suíte estival assombrada por “monstros” e “sereias”, em que, por
intermédio de Virginia Woolf, reflete sobre a condição feminina.
Miles Davis “Take Off: The Complete Blue Note Albums”
(Blue Note, 2014)
Shakeaspeare
sugeriu que talvez só as noites de verão fossem de sonho. Entre 1952 e 1954,
muitos desses serões eternos se passaram ao som de três 10” de Miles Davis,
agora reunidos: “Young Man with a Horn”, “Volume 2” e “Volume 3”, os de
‘Yesterdays’, ‘How Deep is the Ocean’, ‘Enigma’ ou ‘It Never Entered My Mind’.
Paul Bley “Play Blue” (ECM, 2014)
Desde
“Open, To Love” que, também na ECM, e na ocasião graças a repertório de Carla
Bley e Annette Peacock, patenteou Paul Bley, a solo, os seus estudos de
contrastes. Aqui, na gravação anagramática de um concerto em Oslo, de agosto de
2008, dir-se-ia que é verão nas teclas brancas e inverno nas pretas.
Pharoah & The Underground “Spiral Mercury” (Clean
Feed, 2014)
Quem
conhecesse o registo do encontro em Saalfelden entre o espasmódico Pharoah
Sanders e o híbrido com cabeças de serpente engendrado por Rob Mazurek sabia ao
que ia: à invocação do zoroástrico Miles de “Dark Magus”. Este exorcismo, bem
como o complementar “Primative Jupiter” (sic), foi gravado no Jazz em Agosto de
2013.
Sem comentários:
Enviar um comentário