Não há uma designação irrevogável
para as concentrações de detritos que se encontram à superfície dos oceanos e
que possuem como paradigma aquela que se vai apelidando de Grande Depósito de
Lixo do Pacífico ou, na caracterização de Charles Moore, Grande Sopa de Lixo do
Pacífico. Em “Moby-Duck”, de Donovan Hohn, também Curtis Ebbesmeyer recorre à
metáfora, aproximando-a aos giros oceânicos: “É o que acontece quando mexes a
sopa com a colher e ela continua a rodar uns segundos”. Falando acerca da
acumulação de materiais não biodegradáveis no Giro Pacífico Norte pela ação das
correntes marítimas, dizia: “Velejavam por aí conhecidos meus até repararem num
frigorífico aqui, num pneu acolá, boias de vidro de antigas redes de pesca a
perder de vista, plástico por todo o lado.” A descrição traz à memória a passagem
das “Vinte Mil Léguas Submarinas” em que o Náutilus atravessa o mar de sargaços.
Também o cartaginês Himilcão terá referido uma zona algácea em que “bestas
marinhas se movem vagarosamente”. Hoje, trabalhos de investigação como os de Moore
obrigam a substituir os sargaços pelos plásticos e a admitir que mesmo nos
oceanos não há besta maior do que o Homem. Numa área superior a um milhão de
m2, Moore recolheu amostras desse caldo pestilento que batizou de “sopa
plástico-planctónica” e no qual se reconhecem consequências devastadoras para o
meio ambiente e para a cadeia alimentar. Na arte, que não apenas no fotojornalismo,
a câmara de Susan Middleton retratou a situação ao imortalizar o cadáver de um
albatroz que tinha morrido de fome com o bucho cheio, com 250 fragmentos de
plástico nas entranhas.
Agora é o contrabaixista Pascal Niggenkemper a deixar-se
inspirar por tudo isto, por esta “absurda realidade”, com o objetivo de levar esse
“sétimo continente a cantar, chiar, zunir, zumbir e gritar”. O resultado, como
se pode imaginar, aproxima-se da música concreta e, até, da música industrial,
com os pianos preparados de Eve Risser e Philip Zoubek entremeados de objetos
enferrujados e pedaços de madeira, os clarinetes de Joris Rühl e Joachim
Badenhorst imitando guinchos de aves marinhas e o conjunto de flautas de Julián
Elvira, que mais parece a canalização do Náutilus, como que saído das
profundezas. Dotado da fantasia que o tema desmerece, é também deslumbrante.
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