Porque
“New York is Now” se provaria geográfica e cronologicamente confuso,
presume-se, este quinteto norueguês foi buscar o nome a outro disco de Ornette
Coleman: “Friends
and Neighbors: Ornette Live at Prince Street” (1970). Aquele, lá
está, que abria com um coro de amigos e vizinhos cantando alegremente: “Friends
and neighbors/ That’s where it’s at/ Friends and
neighbors/ That’s a rap/ Hand in hand/ That’s the score/ All the world/ Small,
small, small.” E um bacharel em ciências sociais diria que também aqui se
propõe criar um espaço de permanente atrição entre o local e o global, entre o pessoal
e o coletivo, o público e o privado, o abstrato e o material, o sagrado e o
profano, etc. Isto, porque este Friends & Neighbors não será indiferente à
premissa essencial de Ornette: a passagem a um bem de consumo universal e sem
prazo de validade de uma prática artística circunscrita a um certo tempo e a um
certo lugar. No caso, ao famoso loft
de 325 m2, sito no número 131 da Prince Street, no SoHo, no qual Ornette, entre
1968 e 1974, tentou contrariar uma impressão de Nova Iorque com que tinha
ficado e que havia resumido assim: “[Esta cidade] tem o preconceito embutido.
Primeiro na riqueza, depois na cor da pele. E tudo o que se faz na área da
música é avaliado exclusivamente em termos de rentabilidade” (in “Four Lives in the Bebop Business”,
de A. B. Spellman).
Claro que Thomas Johansson (trompete), André Roligheten
(saxofone tenor e clarinete baixo), Oscar Grönberg (piano), Jon Rune Strom
(contrabaixo) e Tollef Ostvang (bateria) são sensíveis ao comentário social do
seu mentor, mas acima de tudo dir-se-iam influenciados pela maneira em que ele revolucionou
estruturas de poder na música. Neste “What Next?” (no fundo, apenas outra forma
de dizer “Tomorrow is the Question!”), em servil imitação, estão as melodias sinuosas,
os ritmos irregulares, o sentimentalismo armazenado em ar comprimido de
Ornette, sim, mas está igualmente a maior lição que nos deixou: um modo de
organização musical comum a um conjunto de pessoas no qual cada uma pode tocar
o que quiser, desde que não deixe de expressar em simultâneo aquilo que efetivamente
lhe permite estar a tocar em grupo, bem como as razões pelas quais, aí e então,
não está a tocar sozinha. Não é fácil de ler, quanto mais de fazer. Os Friends
& Neighbors conseguem-no.
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