Em
2014, com 19 anos, o sul-coreano Seong-Jin Cho cruzava diariamente a esplanade do Musée d’Orsay, em Paris, e
sentia-se no centro do mundo. A justificá-lo, em formação, ao fundo da praça,
as estátuas dos seis continentes, criadas para a Exposição Universal de 1878, com
Europa e Ásia ao lado uma da outra: “[Entrava e] Chegava a passar meia hora, ali,
sentado, a olhar para um dos nenúfares de Monet”, diz. Podia não parecer, mas
tratava-se de uma visita de estudo. E a imagem que salta imediatamente à
memória é a de Claude Debussy, em 1889, noutra Exposição Universal, a dedicar
“horas muito produtivas à kampong
[aldeia] javanesa, atento à polirritmia percussiva de um gamelão que dava
mostras de ser inesgotável em matéria de combinações de timbres etéreos ou
fulgurantes”, contava Robert Godet. “Ele também adorava arte japonesa”,
prossegue Seong-Jin, num depoimento recolhido pela sua editora, “em que a
perspetiva é tratada de uma maneira completamente diferente da ocidental e em
que aquelas partes da tela deixadas em branco têm um significado importante –
como as pausas na sua música”.
Refere-se à palavra japonesa Ma (“intervalo”, “espaço”, “tempo”), o
jovem pianista, cuja aplicação prática, um dia, foi sintetizada nas páginas de
“Japan Architect” por Arata Isozaki nestes termos: “Ma é um alinhamento de sinais – um lugar vazio onde todo o tipo de
fenómenos aparece, passa e desaparece.” Conforme lembrou Mallarmé, em cuja
poesia Debussy tanto se inspirou: “Nomear um objeto equivale a suprimir três
quartos do gozo de um poema… [Já] Sugeri-lo, é um sonho.” Esta forma alusiva,
evocativa e simbólica de proceder guia Seong-Jin pelas seis peças de “Images”,
por “Children’s Corner”, “Suite bergamasque” e “L’Isle joyeuse”, e atrasa os
ponteiros do relógio para o tempo de Gieseking (gravada entre 1951 e 1955, a
sua integral de Debussy foi reeditada este ano) ou, quiçá, para o de Benedetti
Michelangeli, dois que honraram a ambição do compositor em escrever para um “piano
sem martelos”, líquido, quase gasoso. E eis que retorna, esse Debussy, envolto
em incensos e sedas perfumadas.
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