8 de dezembro de 2017

Steve Lacy “Free for a Minute: 1965-1972” (Emanem, 2017)



Em 1998, no seu único disco gravado para a Tzadik, Lacy apresentava o sugestivo ‘Jewgitive’ assim: “Tenho sido um a vida inteira, desde que nos anos 40 me fui desiludindo com as aulas da escola hebraica. Mas, como se costuma dizer, ‘Podes fugir mas não te podes esconder’, e esta peça ilustra-o.” De facto, desde que emigrou para a Europa, em 1965, Lacy manteve a expressão do exílio tatuada no rosto, nas rugas da sua testa a figurada franquia da repatriação (efetiva em 2002, dois anos antes de morrer). Ele, que, evitando-o a todo o custo, até por azar do destino se parecia aproximar de Sidney Bechet – primitiva fonte de inspiração e uma personagem com a qual foi precocemente comparado (constava em inícios de 60 que Lacy era um “Bechet moderno”), embora nada os tenha unido mais que o facto de terem encontrado ambos asilo em França. 

Talvez por isso, em entrevistas, um dos seus mecanismos de defesa recorrentes fosse dizer que não se considerava um expatriado porque não desejava ser “ex-coisíssima nenhuma” (in “Down Beat”). Ou, então, optava por inverter as suas circunstâncias: “Vivo onde a música vive. E onde ela está é onde tenho de estar” (in “Parachute”). Entre as muitas editoras consagradas ao inventário da sua portentosa produção, nenhuma quanto a Emanem tem sido tão pródiga ao documentar essa peripatética existência – “The Sun”, “Cycles” e “Avignon and After” são disso exemplos recentes. Possuem, quando comparados a títulos antológicos, como “Scratching the Seventies” ou “Complete Remastered Recordings on Black Saint & Soul Note”, a particularidade de incluir inéditos – aqui, “Free Fall” (temas de 1967, com Enrico Rava, Karl Berger, Paul Motian e Kent Carter, compostos para um filme, presumivelmente homónimo, que ficou igualmente por estrear) e “The Rush” e “The Thing” (também em quinteto, de 1972, com Carter, Steve Potts, Irène Aëbi e Noel McGhie, a formação de “Estilhaços”). Surgem à boleia da reedição integral de “Disposability” (Vik, 1965) e “Sortie” (GTA, 1966), registos cruciais que põem Lacy a reagir a tipos opostos de provocação: pertencer a uma tradição ou, ao invés, não pertencer a tradição nenhuma. Realmente, nunca na vida dramatizou ele outra coisa.

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