Em
1998, no seu único disco gravado para a Tzadik, Lacy apresentava o sugestivo ‘Jewgitive’
assim: “Tenho sido um a vida inteira, desde que nos anos 40 me fui desiludindo
com as aulas da escola hebraica. Mas, como se costuma dizer, ‘Podes fugir mas
não te podes esconder’, e esta peça ilustra-o.” De facto, desde que emigrou
para a Europa, em 1965, Lacy manteve a expressão do exílio tatuada no rosto,
nas rugas da sua testa a figurada franquia da repatriação (efetiva em 2002,
dois anos antes de morrer). Ele, que, evitando-o a todo o custo, até por azar
do destino se parecia aproximar de Sidney Bechet – primitiva fonte de
inspiração e uma personagem com a qual foi precocemente comparado (constava em
inícios de 60 que Lacy era um “Bechet moderno”), embora nada os tenha unido
mais que o facto de terem encontrado ambos asilo em França.
Talvez por isso, em
entrevistas, um dos seus mecanismos de defesa recorrentes fosse dizer que não
se considerava um expatriado porque não desejava ser “ex-coisíssima nenhuma” (in “Down Beat”). Ou, então, optava por
inverter as suas circunstâncias: “Vivo onde a música vive. E onde ela está é
onde tenho de estar” (in
“Parachute”). Entre as muitas editoras consagradas ao inventário da sua portentosa
produção, nenhuma quanto a Emanem tem sido tão pródiga ao documentar essa peripatética
existência – “The Sun”, “Cycles” e “Avignon and After” são disso exemplos
recentes. Possuem, quando comparados a títulos antológicos, como “Scratching
the Seventies” ou “Complete Remastered Recordings on Black Saint & Soul
Note”, a particularidade de incluir inéditos – aqui, “Free Fall” (temas de
1967, com Enrico Rava, Karl Berger, Paul Motian e Kent Carter, compostos para
um filme, presumivelmente homónimo, que ficou igualmente por estrear) e “The
Rush” e “The Thing” (também em quinteto, de 1972, com Carter, Steve Potts,
Irène Aëbi e Noel McGhie, a formação de “Estilhaços”). Surgem à boleia da
reedição integral de “Disposability” (Vik, 1965) e “Sortie” (GTA, 1966), registos
cruciais que põem Lacy a reagir a tipos opostos de provocação: pertencer a uma
tradição ou, ao invés, não pertencer a tradição nenhuma. Realmente, nunca na
vida dramatizou ele outra coisa.
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