Frank
Sinatra “Ultimate Christmas” (Capitol, 2017)
Há
muitos discos de Sinatra para o Natal: mas o primeiro, de 1948, vezes sem conta
recauchutado pela indústria, é por ora ignorado. Aqui começa-se por “A Jolly
Christmas” (1957), passa-se pelo álbum gravado com os filhos (1968) e conclui-se
com uma ‘Silent Night’ (1991) com Frank Jr. ao piano em que se atinge o inimaginável:
um Sinatra absolutamente sincero.
Ella Fitzgerald “100 Songs for a Centennial” (Verve,
2017)
O
seu primeiro 78 rpm chamava-se ‘I’ll Chase the Blues Away’ e, em rigor, outra
coisa não fazia Ella de cada vez que abria a boca. Nasceu em 1917 e andou à
deriva até que se agarrou ao palco como um náufrago a um salva-vidas.
Suficientemente panorâmica (1936-1966), esta antologia acompanha-a na
edificação de um dos mais expressivos cancioneiros do século XX.
Gregory Porter “Nat ‘King’ Cole & Me” (Blue Note, 2017)
Porter
dramatizou a sua relação pessoal com Cole em 2004 (“Foi o pai que nunca tive”,
dizia em “Nat King Cole and Me”, um musical de vida curta). Agora, pode
dizer-se que a desdramatiza. E mesmo se na capa tem nas mãos o disco que marcou
o regresso de Cole ao mundo do jazz, procura o inverso: mostrar como Cole o
transcendeu. Termina com ‘The Christmas Song’.
The
Christmas Album, Vol. 2 (Deutsche Grammophon, 2017)
Corelli,
Manfredini, Torelli e Locatelli. Ainda a Pasta Primavera não havia sido
inventada e já Filarmónica de Berlim servia pratos destes. Foi em 1970, num
“Christmas Concertos” agora reeditado. E se hoje ninguém abusaria assim da
talha dourada, também poucos na sua posição tiveram tanto conhecimento de causa
acerca do esplendor do barroco quanto Karajan.
Bach:
Sacred Works (Archiv, 2017)
Reedição
da antologia que em 2000 reuniu estas gravações de meados do século passado.
Expandida em termos audiovisuais, possui uma integral das Paixões e um
“Oratório de Natal” inédito. Organista na mesma igreja em que Bach trabalhou, Richter
elevou esta música a um patamar de monumentalidade inconcebível. Quem veio a
seguir não o perdoou.
“Veni Domine” (Deutsche Grammophon, 2017)
Diz
Palombella que esta gravação é uma forma de “espalhar a boa nova” e que o seu
alcance permite “chegar às periferias”. Não sabendo se Palestrina e Victoria
aprovariam a chamada de atenção à Igreja, vale-lhe mais o material anterior à
Contrarreforma – o de Perotinus, Dufay ou Desprez. Aí, sim, fica próximo das
“periferias existenciais” de que falou o Papa.
Beethoven: 9 Symphonies (Deutsche
Grammophon, 2017)
Quando
pela primeira vez viram a luz do dia, em 1980, não se pode dizer que tenham
gerado consenso. Afinal, sabia-se da estonteante série de LP com estas obras
que havia gravado para a CBS ao longo da década de 60 com a Filarmónica de Nova
Iorque e esperava-se novo jogo do gato e do rato com Karajan, que vinha de
lançar mais um ciclo sinfónico de Beethoven com a Filarmónica de Berlim. Mas,
na verdade, estes registos (captados ao vivo entre 1977 e 1979) falam da
necessidade de Bernstein fazer as pazes consigo mesmo. Aliás, o maestro
norte-americano referiu-se ao momento em que, para si, em Viena, com esta
orquestra, uma força poderosíssima e potencialmente devastadora encontrava
lugar no mundo – até então, a música de Beethoven tinha sido uma entidade
indomesticável, “como um satélite à deriva pelo cosmos”, disse. Por isso,
talvez seja mais correto falar-se no momento em que Beethoven fazia as pazes
consigo mesmo. Como Bernstein escreveu em “O Mundo da Música”: essa entidade
“escrita no Céu” a que Beethoven deu corpo “foi-lhe meramente ditada”. Como num
diálogo socrático, sugeria que “o sentimento que nos transmite é o de que há
algo no mundo em que podemos confiar e que nunca nos vai desiludir”. Quando o
seu interlocutor imaginário comenta que se está a aproximar de uma “definição
de Deus”, Bernstein responde: “É o que pretendia.” Confirmou-o anos mais tarde,
com esta integral.
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