Por
mais paradoxal que pareça, em termos cosmológicos, este “A History of Nothing”
remete concetualmente para uma categoria gerada pelo autor de “A Teoria de
Tudo”, Stephen Hawking, quando veio o físico britânico alvitrar que “a criação
espontânea é a razão pela qual existe algo em vez de nada”. Embora
eminentemente metafórica trata-se de uma classificação – como será, digamos, a
da “composição em tempo real” – de que Rodrigo Amado se socorre em entrevistas
para melhor explicar ao que vem: “Improvisando a partir do nada podemo-nos focar
a 100% no momento”, declarou ao Bandcamp Daily. Dir-se-ia um princípio
fundamental da música que faz, conquanto não seja propriamente fácil de
realizar. Daí, quiçá, a necessidade – a que dá resposta este grupo com Joe
McPhee, Kent Kessler e Chris Corsano – de se rodear de “grandes músicos, bem
melhores e mais experientes do que [ele]”, como sugeriu ao JL.
É uma frase algo
enervante, pois não obstante aparentar modéstia, a verdade é que não deixa
igualmente de insinuar que Rodrigo, através dessa prática, estaria, primeiro,
como que a fazer audições para uma certa ideia de grandeza e, segundo, a ir
sucessivamente ao encontro de músicos permeáveis à idolatria – seja como for,
em virtude, até, do seu apelido, e obviamente de modo irónico, seria
irresistível argumentar que havia, aí, qualquer coisa do “Transforma-se o
Amador na Cousa Amada”, de Camões. Mas Rodrigo não terá razões para se
preocupar. Até porque em sua defesa logo surge Herberto Helder, lembrando que
“o amador (…) transforma a coisa amada” e que “o amador e a coisa amada são um
único grito”. Isto, porque nunca como neste seu disco o saxofonista foi tanto aquilo
que sempre deu mostras de querer ser: alguém capaz de desfiar o forro da
história do jazz até a pôr do avesso e a depender de linhas invisíveis. Em
“History of Nothing”, de 1962, Eduardo Paolozzi provava que a reprodução pictórica
do mundo não passava sem novas imagens. Agora, neste “A History of Nothing”, confirma-se
que a sua representação musical carece também de novos sons. O nada, aqui? Talvez
só o tal céu noturno de que falava Emil Cioran – e contra o qual, dizia,
projetamos o fogo-de-artifício da cultura.
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