16 de fevereiro de 2019

Vienna: Fin de Siècle (Alpha, 2018)


Conversam De Leeuw e Hannigan acerca da ascensão e queda da Casa de Habsburgo, ou coisa que o valha, e o que salta à memória é aquele instante de “Star Trek IV: Regresso à Terra” (1986) em que o Capitão Kirk leva a trupe de oficiais da USS Enterprise a viajar no tempo (precisamente para meados da década de 80 do século passado) e se sente na obrigação de fazer a seguinte advertência: “Cuidado. É uma cultura extremamente primitiva e paranóica.” Agora, apontando agulhas para a Viena de finais do século dezanove, pianista e cantora discutem um mundo virado “de pernas para o ar”, “à beira do colapso” e da “catástrofe” independentemente, claro, de estar recheado de génios! Gente que, prossegue De Leeuw, ansiava desesperadamente pelas palavras certas que lhe permitissem “formar uma nova gramática musical e inclusivamente uma nova linguagem harmónica” e partir assim “rumo ao desconhecido”. Como é óbvio, na introdução, se fosse um documentário, ouvir-se-ia alguém dizer: “Tonalidade – a última fronteira.” 

Se bem que, em “Viena – Fin-de-siècle: Política e Cultura”, Carl Schorske tenha antes falado de “explosão no jardim”. Vem daí uma imagem que se cola com frequência ao período: a de uma vertiginosa valsa que se vai fragmentando tanto quanto no espaço se vai soltando a fuselagem de uma nave que atinge velocidades para que não está preparada. Aqui capta-se o momento imediatamente anterior à sua total desintegração: Schoenberg, Webern, Berg, Zemlinsky, Alma Mahler e Hugo Wolf semeando de maus agouros a estrutura da canção romântica sem a fracionar em definitivo. Será tudo vagamente anacrónico – do responsável pela “emancipação da dissonância”, como lhe chamou, e respetivos acólitos, bem como de Zemlinksy, surgem opúsculos pré-históricos e de Alma vem outro perfeitamente dissociativo, da altura em que tinha mais em mente o amante que o marido – e só o mais antigo, o de Wolf, é algo significativo. Mas a verdade é que jamais se cantou com tão poucos átomos de espessura o que separa a tonalidade da atonalidade, com Hannigan a lembrar o “Nuda Veritas”, de Klimt, em que uma mulher nua segura um espelho virado para quem olha para si. Nunca esteve esse espelho tão perto de se quebrar.

Sem comentários:

Enviar um comentário