Conversam De Leeuw e Hannigan acerca da ascensão e
queda da Casa de Habsburgo, ou coisa que o valha, e o que salta à memória é
aquele instante de “Star Trek IV: Regresso à Terra” (1986) em que o Capitão
Kirk leva a trupe de oficiais da USS Enterprise a viajar no tempo (precisamente
para meados da década de 80 do século passado) e se sente na obrigação de fazer
a seguinte advertência: “Cuidado. É uma cultura extremamente primitiva e
paranóica.” Agora, apontando agulhas para a Viena de finais do século dezanove,
pianista e cantora discutem um mundo virado “de pernas para o ar”, “à beira do colapso”
e da “catástrofe” independentemente, claro, de estar recheado de génios! Gente que,
prossegue De Leeuw, ansiava desesperadamente pelas palavras certas que lhe permitissem
“formar uma nova gramática musical e inclusivamente uma nova linguagem
harmónica” e partir assim “rumo ao desconhecido”. Como é óbvio, na introdução,
se fosse um documentário, ouvir-se-ia alguém dizer: “Tonalidade – a última
fronteira.”
Se bem que, em “Viena – Fin-de-siècle: Política e Cultura”, Carl
Schorske tenha antes falado de “explosão no jardim”. Vem daí uma imagem que se
cola com frequência ao período: a de uma vertiginosa valsa que se vai fragmentando
tanto quanto no espaço se vai soltando a fuselagem de uma nave que atinge velocidades
para que não está preparada. Aqui capta-se o momento imediatamente anterior à sua
total desintegração: Schoenberg, Webern, Berg, Zemlinsky, Alma Mahler e Hugo Wolf
semeando de maus agouros a estrutura da canção romântica sem a fracionar em
definitivo. Será tudo vagamente anacrónico – do responsável pela “emancipação
da dissonância”, como lhe chamou, e respetivos acólitos, bem como de Zemlinksy,
surgem opúsculos pré-históricos e de Alma vem outro perfeitamente dissociativo,
da altura em que tinha mais em mente o amante que o marido – e só o mais antigo,
o de Wolf, é algo significativo. Mas a verdade é que jamais se cantou com tão
poucos átomos de espessura o que separa a tonalidade da atonalidade, com
Hannigan a lembrar o “Nuda Veritas”, de Klimt, em que uma mulher nua segura um
espelho virado para quem olha para si. Nunca esteve esse espelho tão perto de
se quebrar.
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