4 de abril de 2015

Samba Touré “Gandadiko” (Glitterbeat, 2015)



Já se sabe que, no que a enforcados diz respeito, os ‘Strange Fruits’ de que Billie Holiday falava, oscilando ao vento e bafejados pelo doce e fresco aroma das magnólias e pelo súbito fedor da carne em chamas, possuíam precedente histórico na medieval ‘La Ballade des Pendus’, em que as vistas, barbas e sobrancelhas dos mortos eram extirpadas pelas bicadas de pegas e corvos, ou no ‘Le Verger du Roi Louis’, de Banville, posteriormente adaptado por Brassens, do pomar decorado com cachos dos mais extraordinários frutos. Também agora, no mais esclarecido dos seus discos, vem Samba Touré cantar acerca de um solo queimado – “o gado é só pele e osso/ e muito em breve também nós estaremos assim”, ouve-se na titular ‘Gandadiko’ – e de umas “árvores secas como esqueletos/ nuas, fracas”, em ‘Touri Idjé Bibi’, que dão uma “fruta negra, vazia, sem sabor/ fruta plástica do mundo moderno”. E do mesmo modo se refere o trovador maliano aos cadáveres que pelo ano inteiro foi encontrando “cobrindo as estradas/ preenchendo as entranhas das ovelhas/ à porta das escolas e das mesquitas/ bem no centro das nossas casas”. Aliás, “Albala”, o seu álbum anterior, denunciava já a doutrinária versão da jurisprudência islâmica que se alastrava pelo norte do país impondo um quotidiano de angústia e aflição. Agora, dir-se-ia que são tão criminosas as condições climáticas quanto as cimitarras que os colos cortaram. Talvez por isso, em ‘Woyé Katé’, termine a reclamar por reconstrução e restituição, enquanto, na língua berbere, Ahmed Ag Kaedi, da banda tuaregue Amanar, sugere que terra e cultura são sinónimos.

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