10 de setembro de 2016

Metá Metá “MM3” (Jazz Village, 2016)



Primeiro, em 2011, foi o afro-samba avessado, alforriado, acústico e nada abúlico da estreia homónima. Depois, em 2012, o capítulo do exulcerante choque elétrico, catártico e cataclísmico de “MetaL MetaL”. Agora, esses expressivos e contrastantes exercícios de Kiko Dinucci, Juçara Marçal e Thiago França dir-se-iam coadunados, não tivesse o excesso de corrente desterritorializado a sua ação. Pois, por mais que preserve os aromas acres dos terreiros de candomblé, a verdade é que “MM3” surge embalado por modalismos levantinos, embora, em comunicado, o trio denuncie influências “de países como Marrocos, Etiópia, Níger e Mali”. Em termos estéticos e éticos há um precedente histórico para tamanha migração, no pós-punk britânico, quando o embrião dos 23 Skidoo identificou em si o protoplasma de Fela Kuti, quando os Rip Rig + Panic deram no seu ADN pelo free jazz, quando os African Head Charge apontaram a via de Tombuctu ou, como é óbvio, no instante em que os Pigbag de ‘Brazil Nuts’ cruzaram estruturas rítmicas potencialmente brasileiras com presumíveis escalas pentatónicas árabes.

Trata-se da adoção de uma nova identidade ou, quiçá, da aceitação de um exílio. O que é o mesmo que dizer que esta prática nasce da necessidade de contestar uma cultura. Mas se uns dirigiam sortilégios a Margaret Thatcher, os Metá Metá apontam as setas ao executivo de Michel Temer. Num clip promocional, Dinucci reconhece que o disco foi “gravado no olho do furacão” e que nele se “vai ouvindo um pouco dessa terra em transe, desse tempo político que a gente tá vivendo”. A referência ao “Terra em Transe”, de Glauber Rocha, logo traz à memória aquele desabafo, no filme, que vai do “Não é mais possível esta festa de medalhas, este feliz aparato de glórias, esta esperança dourada nos planaltos, etc.” até ao “Até quando suportaremos? Até quando, além da fé e da esperança, suportaremos? Até quando, além da inconsciência do medo, suportaremos?”. Coisas que os Metá Metá dizem assim: “Uma esperança morta pra lá/ Uma ferida aberta pra cá/ Um carnaval onírico/ É, não deu, não dá” ou “Escuridão/ Oco voraz/ Vai engolir o mundo/ Regurgitar/ Boca funil/ Amanhã come o ontem”. E entre guinchos terebrantes ao saxofone, corais convulsos, estilhaçados acordes à guitarra, jogam um petardo às forças reacionárias.

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