Em outubro de 1995, “munido de um
amplificador Roland, duas guitarras e com a bagagem de porão a transbordar”,
Banning Eyre, músico, jornalista e editor do programa de rádio e revista
digital “Afropop Worldwide”, apanhou um voo de Nova Iorque para Bamako. Aguardava-o
Djelimady Tounkara (líder da Super Rail Band e força motriz da música moderna maliana),
com quem iria passar sete meses em aprendizagem. Foi um discipulado que revelou
falta de vocação de ambas as partes, embora o relato da experiência (“In Griot
Time”) seja de leitura obrigatória. Na véspera de regressar aos EUA, Eyre passou
pelo complexo habitacional dos Tounkara, para o qual tinha convidado amigos de
que se queria despedir. “Nessa noite sentia-se uma estranha turbulência pelo ar”,
conta. “O vento soprava pó e detritos por todo o lado e poucos se aventuravam a
sair de casa. Mas o Harouna [Samaké] apareceu, de kamalé ngoni na mão. Insisti para que ele e o Djelimady me tocassem
qualquer coisa e eles assentiram, misteriosamente fluentes na linguagem musical
um do outro. Ouvi-los cantar ‘Lamban’, um clássico griô, foi como uma recapitulação
de tudo o que tinha aprendido. Se fosse produtor era isto que desejaria gravar: rompia com a tradição; não se encaixava em formato nenhum; era música
radiosamente espontânea, o segredo mais bem guardado do Mali.” No dia seguinte
começava a estação das chuvas e Eyre escrevia a última linha do seu livro rumo
ao aeroporto: “Rios de lama levavam o entulho ressequido de uma estiagem de sete
meses e séculos de canções ressoavam em mim.” Dez anos depois, em 2005, de
volta a Bamako, viria a sentir tudo isto outra vez ao assistir a uma atuação do
cego Noumoussa Soumaoro, ironicamente apelidado de “Vieux Kanté”, um fenómeno
que ficou em trânsito para a história como o ‘Jimi Hendrix do kamalé ngoni’ (faleceu por essa altura,
aos 31 anos). A par de “Sans Commentaire” (outra das suas alcunhas, pois era a
única reação possível ao seu virtuosismo), editado em 2013, esta é única
gravação sua que se conhece. E foi Eyre que a levou à Sterns. E, sim, chega com
a força de uma monção.
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