Há uns
anos, numa entrevista para a defunta “Tokafi”, perguntaram-lhe o que constituía
uma boa atuação. Lindberg, que na altura comemorava o seu quinquagésimo
aniversário, respondeu assim: “Será aquela em que, independentemente da troca
de estímulos entre si, os intérpretes alcancem um plano unificado de expressão
capaz de transcender o pensamento e de transmitir ao público uma experiência
visceral. O meu objetivo pessoal, aliás, é sempre esse: chegar a esse ponto que
vai além da ideia e que permite atos criativos livres, espontâneos, aptos a
tocar o coração dos ouvintes.” Também na sua discografia o tem demonstrado, através
de títulos como “Give and Take” (1985), “Quartet Afterstorm” (1994), “A Tree
Frog Tonality” (2000), “Winter Birds” (2004) ou “Celestial Weather” (2015),
isto, claro, para além do seu trabalho com Anthony Braxton, ainda adolescente,
com o String Trio of New York ou, ao longo da última década, com Wadada Leo
Smith. Agora, a respeito de resiliência e resistência, de resignação e ressurreição,
com Wendell Harrison (clarinetes) e Kevin Norton (vibrafone e percussão),
produz um dos seus discos que mais sentimento revela, inspirado pela ética de
trabalho da classe operária (em inglês, do trabalhador de colarinho azul, ou blue-collar, daí, presume-se, a
designação BC3), por histórias de sobrevivência, pelo apelo da vida comunitária
mas também daquela que se leva em comunhão com a natureza, pela reação às
forças destrutivas que o rodeiam. Escuta-se, e o que salta à memória é o
parágrafo inicial de “O Amante de Lady Chatterley”, de D. H. Lawrence: “A nossa
época é essencialmente trágica, por isso recusamo-nos a aceitá-la como tragédia.
O cataclismo deu-se, estamos rodeados de ruínas, construímos novos lugares onde
viver, enchemo-nos aos poucos de esperanças. Não é nada fácil. Já não há um
caminho tranquilo rumo ao futuro: mas contornamos os obstáculos ou passamos-lhe
por cima. Por mais que o céu continue a desabar sobre as nossas cabeças, temos
de viver.”
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