Gaye Su Akyol “Hologram Imparatorlugu” (Glitterbeat,
2016)
Aterrou
recentemente em lojas portuguesas este óvni de 2016, plasmado a partir do
meridiano do psicadelismo anatólico da década de 70 (Selda, Cem Karaca, Ersen,
Erkin Koray, et al.). Sarcástico e
sério (o título traduz-se por “Império do Holograma”), sensual e surreal (salta
da cama ao cosmos sem pudor), projeta a estrutura modal turca na voragem de um
buraco negro. Num verso: “A forma é amorfa.”
Avi
Avital & Omer Avital “Avital Meets Avital” (Deutsche Grammophon, 2017)
Costuma
dizer-se que há quem aproveite o verão para mudar a pele. Já os israelitas Avi
e Omer Avital, por sua vez, decidiram reinventar-se enquanto instrumentistas de
modo a sentirem-se mais confortáveis na sua. É o que se vislumbra ouvindo ‘Ana
Maghrebi’ (i.e.: Eu sou marroquino) e todo este conjunto de modas
mediterrânicas mergulhadas em água morna e temperadas pelo perfume de uma
saudade comum.
Miles Davis “At Fillmore” (Music on CD, re. 2017)
É
a reedição de 1997, aquela em que pela primeira vez se indexavam os temas e se modelava
o magma que a banda de Miles (Grossman, Corea, Jarrett, Holland, DeJohnette,
Airto) extraía em 1970 às entranhas da terra. Na íntegra, este material viria a
culminar nos 250 minutos de “Miles at the Fillmore: The Bootleg Series Vol. 3”,
em 2014, mas basta um segundo para se comprovar a sua eterna ignescência.
Herbie
Hancock “Sunlight” (Music on CD, re. 2017)
Em
1977 estreava “Saturday Night Fever”, abria o Studio 54 e um êxito à escala
planetária como ‘I Feel Love’, de Donna Summer, prescindia de instrumentos
acústicos. Na TV falava-se de computadores pessoais e de viagens espaciais e,
em estúdio, no verão, rodeado de sintetizadores e de um vocoder, o Herbie Hancock de “Sunlight” via a luz solar refletida
numa bola de espelhos. O tempo só lhe fez bem.
“4 Cities” Fazil Say, Nicolas Altstaedt (Warner,
2017)
Algo
voltadas para o passado e afetadas pela fugacidade da experiência humana, estas
sonatas de Debussy (1915), Janácek (versão revista de 1923) e Shostakovich
(1934), que Say e Altstaedt reúnem, possuem muito em comum com essoutra que
ganha aqui primeira gravação – exatamente “Four Cities”, de 2012, da autoria do
próprio pianista, evocação de quatro cidades turcas que força a viajar pela
memória.
“El
Amor Brujo – Esencias de la Música de Manuel de Falla”, Euskal Barrokensemble,
Enrike Solinís (Alia Vox, 2017)
Em
busca de um imemorial odor levantino, vai-se de Scarlatti a Rodrigo, de Cantemar
a Tárrega, passando pelas páginas que mais cheiravam a figo e a flor de
laranjeira na obra de Falla com María de la O Lejárraga (de ‘Canción del amor
dolido’ e ‘Canción del fuego fatuo’ a ‘Danza del juego del amor’).
Monteverdi: Madrigali Vol. 3 – Venezia (Harmonia Mundi,
2017)
Nasceu
há 450 verões, Claudio Monteverdi. E nada melhor para o lembrar do que o
derradeiro capítulo desta trilogia de gravações que Les Arts Florissants lhe
dedicam, agitadamente consagrado aos livros sétimo e oitavo de madrigais, tomos
dos quais se extrai o néctar amargo e doce da guerra dos sexos.
Delius: Orchestral & Choral Works (Warner, 2017)
Para
aqueles tristes entardeceres em câmara-ardente, em que do verão se ergue um
monumento ao remorso, fica bem algo, assim, tão obsoleto quanto o Frederick Delius
de “Songs of Sunset”, “In a Summer Garden”, “Summer Night on the River” ou
“Summer Evening”, com Beecham a jogar em casa e com perfeita consciência de
que, aqui, cada nota parecia saída de uma espreguiçadela iniciada no século
anterior.
Sem comentários:
Enviar um comentário