Há cerca de um ano, em entrevista ao Expresso, Tim
Berne explicava que se estava a preparar para entrar em estúdio com Matt Mitchell,
pianista nos seus Snakeoil: “[…] Vai gravar um disco com música minha para
piano solo. Escolhemos juntos o material a partir dos últimos 10 ou 15 anos,
pelo que abarca períodos muito diferentes.” Na altura, depositava igualmente
esperanças em Manfred Eicher, sugerindo que fosse provável que o resultado viesse
a interessar ao fundador da ECM. Mas eis que, entretanto, aí está o CD, lançado
pela própria editora de Berne. E tem consequências algo perversas, “Forage”, em
que tudo é muito mais opaco e angular do que aquilo que se poderia supor, como
numa composição cubista feita a partir de originais já de si extraordinariamente
densos e sinuosos. Dir-se-ia que Mitchell, no que diz respeito à obra de Berne,
preferiu voltar a emaranhar o nó, tornando sincrónico o que evoluiu no tempo, jogando
sozinho ao cadavre exquis. Seguiu também
num sentido contrário àquele que a música de Snakeoil sugere, em que a transparência
não compromete a tridimensionalidade, a monumentalidade não ameaça a minuciosidade,
o estudo não invalida o ato espontâneo, o excesso de informação não anuvia o
exotismo.
São tudo coisas em que se pensa ao escutar qualquer um dos quatro
discos do grupo, mas que são óbvias em “Incidentals”. Aliás, regressando à
entrevista, Berne dizia estar “muito satisfeito com ‘You've Been Watching Me’”
(2015), mas sugeria igualmente que, em matéria de álbuns, “o próximo é o melhor”.
Nesse particular estava em controlo de todas as variáveis, claro. E é bem
possível que tivesse razão. O quinteto é o mesmo do disco anterior (Berne com
Mitchell e Oscar Noriega nos clarinetes, Ryan Ferreira em guitarras e Ches
Smith à percussão) e curiosamente o material procede da mesmíssima sessão de
gravação (dezembro de 2014). Mas o que aqui está, na vida de Berne, só possui precedentes
no seu primeiro encontro com Julius Hemphill, quando, de chofre, e de modo muito
inesperado, o seu futuro mentor se vira para ele e diz: “Tenho andado a pensar
muito em magia.”
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