Com uma
lona a cobrir o bronze de Robert E. Lee em Emancipation Park no centro das
atenções, e à luz de acontecimentos recentes em Charlottesville, têm-se discutido
símbolos afetos à elite agrária e escravocrata que dominou o sul dos Estados
Unidos até à Guerra de Secessão. Mas já há um ano, em Houston, se debatia a
mudança de nome da Lanier Middle School, batizada em honra do poeta e músico Sidney
Lanier, personagem que, por sinal, possui uma biografia curta e curiosa, com passagem
fugaz pelo exército confederado (na base da celeuma atual), pela advocacia,
pela docência ou pelo fantasioso, disciplina em que, ao longo de 1876, na revista
literária “Lippencott’s”, e sem ter posto um só pé no subcontinente, publicou uma
série de crónicas de viagem chamada “Esboços da Índia”. Numa, ao descrever os
movimentos de uma bailarina, dizia assim: “Reparei que tremia por inteiro e
que, não obstante, era capaz de manter um ar de enorme elegância. A sua atuação
resumia-se a lânguidas alterações a essa postura e a uma miniatural dança dos
nervos do seu corpo.”
A frase parece feita à medida deste extraordinário “Nerve
Dance”, claro, e a verdade é que o disco do quarteto de Attias permanece em
diálogo aberto com as ambiguidades que conjuga e com a tensão que o cerca. Numa
entrevista a “Jazz Right Now”, o saxofonista diz preferir a música que
pressupõe a “democracia do ouvido” e respeitar uma plateia que aceite estar
“perante o desconhecido” – ele, que, em 2015, num ensaio, sugeriu que o
“improvisador é um completo estranho à música”, pois “a música é revolta”, um “corpo
que ensino a dançar ao contrário”. É uma referência a Artaud, a coreográfica expressão,
e ao sujeito enquanto identidade inacabada. Em junho, a “JazzTrail”, assumia
não ter identidade, no sentido em que não queria “ficar preso a uma certa
imagem” de si próprio – queria ir “mais fundo”. Nunca, como aqui, e jamais num
momento tão necessário. Ouve-se “Nerve Dance” e sente-se o
jazz a rebelar-se contra a tirania das construções identitárias, como um tijolo
de lucidez atirado a flash mobs de
neonazis em Charlottesville.
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