Ali, entre 1974 e 1975, até os trópicos andavam privados de calor. E
quando se falava em nova ordem mundial, por exemplo, não seria tanto para
fender a barricada global com que os militares simulavam defender os povos
quanto para aludir à capacidade de estourar o planeta com o pressionar de um
botão. No Brasil, segundo um documento há coisa de meses tornado público pelo
governo norte-americano, reuniam-se Ernesto Geisel (o Presidente do país), João
Batista Figueiredo (chefe do Serviço Nacional de Informações) e os generais
Milton Tavares de Souza e Confúcio Danton de Paula Avelino (do Centro de
Inteligência do Exército) para renovar a recomendação de que “os métodos extralegais
deveriam continuar a ser empregados contra subversivos perigosos” – de facto,
não havia nada de novo sob o sol. Daí, porventura, este súbito abraçar da
utopia em três expoentes do transcendentalismo brasileiro, que, em termos
fonográficos, se materializou na santíssima trindade do esoterismo aplicado à
música popular: em “Gita”, de Raul Seixas, em “Racional”, de Tim Maia e, claro,
em “A Tábua de Esmeralda”, de Jorge Ben.
Nem por acaso, da boca de Ben, as
primeiras palavras que se ouvem nesta sua obra-prima são: “Não,
não: senta! Senta! Não, não: senta. Não, não! Pra sair legal, senta.”
Como quem lidera um culto, apelando ao sentido de ritual que há em cada um, o
cantor reunia em torno de si uma mão-cheia de convidados e só depois dizia ao
que vinha, num dos mais singulares e significativos desafios à métrica da sua
obra: “Eles são discretos e silenciosos/ Moram bem longe dos homens/
Escolhem com carinho a hora e o tempo do seu precioso trabalho/ São pacientes,
assíduos e perseverantes/ Executam segundo as regras herméticas”, canta em ‘Os
Alquimistas Estão Chegando’. De seguida, com as respetivas doutrinas plasmadas
nas letras das canções e em estruturas prenhes em arcaísmos, entram em cena
Hermes Trismegisto, Nicolas Flamel, Paracelso e Fulcanelli, embora Ben também cite
o Erich von Däniken de “Eram os Deuses Astronautas?”. Tinha mesmo de sondar o céu
quando a terra de tão pouco lhe servia. A fechar a década, em ‘Alô, Alô
Marciano’, até Elis Regina se poria à conversa com homenzinhos verdes.
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