Ary
Barroso “Meu Brasil Brasileiro” (Aquarela do Brasil, re. 2018)
Nos
anos 50 não era assim tão comum um músico revisitar o próprio catálogo, como fez,
aqui, Ary Barroso com canções suas da década de 30. Em versão pingue-pongue, o
conceito estendia-se a “Um Interpreta o Outro” (também incluído nesta
reedição), com Barroso e Dorival Caymmi fazendo o que o título dizia e recuperando
para a era-Kubitschek um repertório muito preso aos balangandãs de Carmen
Miranda.
Caetano,
Moreno, Zeca, Tom Veloso “Ofertório – Ao Vivo” (Universal, 2018)
Mais
uma transfusão na carreira de Caetano, desta feita indo diretamente ao cerne da
questão e, ao recorrer a sangue do seu sangue, isto é, aos seus filhos Moreno,
Zeca e Tom, dando até mais corpo a esta eucarística metáfora de que por ora se
socorre. O repertório é transversal, muito católico e a prole até canta uma
canção que lhe precedeu: ‘A Tua Presença Morena’, de 1971.
Fatoumata
Diawara “Fenfo” (Wagram, 2018)
Cada
vez mais apta em transferir a sua arte do domínio da poesia para o da política,
e vice-versa, Fatoumata canta sobre amores separados à fronteira como se fosse
capaz de antecipar ciclos noticiosos. Mas também canta sobre amores que superam
fronteiras simbólicas, como a da identidade étnica. A compositora maliana não
lançava um disco desde a sua estreia com “Fatou”, em 2011 – não perdeu pitada.
Gal
Costa “Legal” (Elemental, re. 2018)
Tomado
de uma brilhante intuição, quando a apresentou ao mundo, em 1967, Caetano disse
que Gal participava da qualidade de “violentar o gosto contemporâneo”. Nem ele
sabia o quanto. Três anos depois estava já a ditadura instalada, ele exilado e
ela a segurar a barra da contracultura. “Legal” é um marco desse período e o
despertar daquele sentimento que viria a culminar no verão das “dunas de Gal”.
Konkere
Beats “Yoruba!” (Soul Jazz, 2018)
A
música viaja desde que foi necessário regular o movimento dos remadores numa
embarcação. Mas nunca o terá feito em tão larga escala quanto no auge do
tráfico negreiro, presume-se. A partir de Lagos, na Nigéria, a Soul Jazz
promove, então, um retrato da diáspora ioruba cheio de ecos de outros ecos a
assaltar ouvidos e a memória (do candomblé à santería) – todas as coisas do mundo a ficar ligadas.
Shina
Williams & His African Percussionists “African Dances” (Mr. Bongo, re.
2018)
A
direção musical é de Biddy Wright (então, em 1979, produtor de C. S. Crew ou
Lijadu Sisters) e os músicos, vindos das bandas de Tee Mac, Sonny Okosun ou
Orlando Julius, os melhores que o naira nigeriano podia comprar. Faz a chamada
no afrobeat mas vai já lançado pelo
ar em direção ao boogie e ao coração
da pista de dança. É um verão eterno que só o Golpe Militar de 1983 fez
terminar.
Sonido
Gallo Negro “Mambo Cósmico” (Glitterbeat, 2018)
Enquanto
uns insistem em erguer barreiras, outros há que teimam em deitá-las abaixo ou a
voar-lhes por cima – uma metáfora mais apropriada para descrever o que, aqui,
ao seu terceiro álbum, de tanto ler realismo mágico, presume-se, ou, quiçá, de
tanto ouvir os registos mais psicadélicos de cumbia colombiana e chicha
peruana, faz esta trupe mexicana aos géneros musicais. Trump não lhes daria
visto.
Too
Slow To Disco: Brasil – Compiled By Ed Motta (How Do You Are?, 2018)
A
maior parte dos temas aqui incluídos são de 1982-83 (Sandra Sá, Filó, Biafra,
Brylho, Junior Mendes, Roupa Nova) e têm mão de Lincoln Olivetti e Robson Jorge.
É o som do Brasil a sair da camisa-de-forças da ditadura, a fugir rumo ao
futuro (eleições diretas, videojogos, Manchete) e a levar consigo um miúdo chamado
Ed Motta que agora retribui o favor.
Sem comentários:
Enviar um comentário