14 de setembro de 2019

Riley: Sun Rings (Nonesuch, 2019)


No início dos anos 90, em CD, foi lançada uma pequena coleção chamada NASA – Voyager Space Sounds em que cada título incluía a seguinte nota introdutória: “A complexa interação de gases ionizados no universo, a emissão de partículas carregadas provenientes da coroa solar ou a magnetosfera dos diferentes astros, anéis e luas criam ‘paisagens’ sonoras que são a um só tempo totalmente estranhas e profundamente familiares ao ouvido humano.” Sem mais demoras, a explicação logo aproximava ao sopro do vento ou ao canto dos golfinhos tudo isso que se podia escutar nas gravações realizadas a bordo das sondas espaciais Voyager ao longo da sua viagem pelo Sistema Solar. Pois, como teria dito György Lukács (com a anuência de George Lucas): “Afortunados os tempos para os quais o céu estrelado é o mapa dos caminhos transitáveis e a serem transitados, e cujos rumos a luz das estrelas ilumina. O mundo é vasto, e no entanto é como a própria casa, pois o fogo que arde na alma é da mesma essência que as estrelas.” Exatamente o tipo de pensamento (mais coisa, menos coisa) com que Terry Riley [na foto, em setembro de 2000, junto a David Harrington, o diretor artístico do Kronos Quartet] se tem vindo a alinhar desde que há 50 anos editou “A Rainbow in Curved Air”, cantarolavam os Beatles ‘Across the Universe’ e Bowie ‘Space Oddity’. Agora, com “Sun Rings”, conclui: “Se concedêssemos às estrelas o poder de nos fazer ver a perspetiva geral do universo, a partir disto a que chamamos Terra, talvez conseguíssemos amar e apreciar toda e qualquer forma de vida.”

Está, então, a fazer eco da mensagem de Jimmy Carter gravada no Disco Dourado e despachada nas Voyager (“Esta é uma prenda de um mundo distante, um testemunho dos nossos sons, da nossa ciência, das nossas imagens, da nossa música, ideias e sentimentos. Estamos a tentar sobreviver ao nosso tempo para que possamos chegar ao vosso”), isto é, da exploração espacial enquanto auto-ajuda, placebo que transfere momentaneamente para a órbita do quarteto de cordas com o auxílio de um coro (em dois andamentos) e desses sons captados a milhões de quilómetros de nós. Tratando-se de Riley, estão cá as sequências de notas tão naturais quanto – no ioga – são as posições da Saudação ao Sol, aqueles padrões rítmicos algo enteogénicos, misteriosas melodias imbuídas da aura de um emissário do Oriente. Porque, para si, o espaço sideral se apresenta sobretudo como um espaço de cura, mas, também, porque, como Chico dizia, dá mostras de saber que há “mais samba no chão do que na lua” – o cinquentenário do Apollo 11 que o perdoe.

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