Elizabeth Joy Roe (p), London Symphony
Orchestra, Emil Tabakov (d)
De vestido claro, com apliques em brocado dourado,
languidamente estendida de barriga para baixo sobre um piano de cauda, Elizabeth
Joy Roe prende o longo cabelo escuro junto à nuca com a mão esquerda enquanto
se deixa evadir para fora de campo com o olhar. É uma foto, na contracapa deste
CD, que possui inúmeras leituras. Por um lado, poderá querer dizer que a Decca
tem nos seus quadros executivos com menos vergonha na cara do que os
organizadores do Salão Automóvel de Xangai, de abril, que este ano dispensaram
dos seus corredores aquelas – o quê? Hospedeiras? – que se destinam a disfarçar
a vulgaridade do que aí se propõe tapando-se com sorrisos e pouco mais. Por
outro, é perfeitamente possível que a editora venha, assim, através de uma
alusão direta a um estereótipo sexista das artes gráficas, transferir para o
domínio do fetiche aquilo que de mais contraditório deteta a sua própria
pianista nestas obras: “Os caprichos e as virtudes da espécie humana – o seu
humor e as suas tragédias, as suas lutas e aspirações, a banalidade e a
reverência”, conforme explicita em perspicazes, curiosas e especulativas notas
de apresentação (em que só falta sugerir uma coisa: que o “Concerto para Piano,
Op. 38”, de Barber, podia muito bem ter sido o concerto para piano que Britten tivesse
vindo a compor, em 1962, caso tivesse ficado nos EUA em vez de ter tornado a
Inglaterra, em 1942; pelo menos está cheio do canto de pássaros que Britten jamais
ouviu). Porque tudo, aqui, surge afetado pela psicologia e pelo simbolismo.
Incluindo um programa a que, para voltar ao tema, se alude nesta capa em que
uma (não tão pequena) sereia representa a virtual comunicação transatlântica patente
no disco.
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