Após uma travessia do Atlântico prenhe em
premonições, foi há 100 anos que Enrique Granados assistiu à estreia da versão
operática de “Goyescas”, em Nova Iorque. Com Amparo, a sua mulher, a seu lado,
viveu num corrupio, agitado por um vendaval de coquetéis e receções, incluindo
uma ida à Casa Branca. “Vi por fim os meus sonhos realizados”, escreveu inocentemente
numa carta endereçada a Ricardo Viñes. A 24 de março de 1916, na viagem de
regresso a Barcelona, contar-se-iam os Granados entre as cerca de oitenta
vítimas causadas pelo torpedeamento do paquete SS Sussex por um submarino de
guerra alemão. Estamos, portanto, em ano de centenário. E é adequado que se assinale
o seu início com uma obra como esta, menos irradiada pelo nacionalismo musical
espanhol do que pelos modelos centro-europeus que tanto Granados como Joaquín Turina
parecem ter vindo ao mundo disputar. De facto, neste “Quinteto para Piano”, de
1895, pressente-se mais a fragrância dos salões parisienses e dos vapores do
Elba, por exemplo, do que qualquer tipo de impressão que se associe a uma índole
hispânica – “Ambiciono tornar-me no meu país o que Saint-Saëns ou Brahms são
nos deles”, referiu, e dá aqui voz às suas dores de crescimento. Mas a peça é
um pequeno prodígio de inventivas combinações harmónicas e inspiradas
colorações, na qual, por instantes, se adivinha já o casulo da nostalgia pelo
sul. De 1907, também o “Quinteto” de Turina só por uma vez permite que um
levantar de sobrolho ibérico perturbe um semblante galófilo e germanófilo,
expressão de doutrinas face às quais logo passaria de apóstolo a apóstata.
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