2 de abril de 2016

"Czech Up! Vol. 1: Chain of Fools" (Vampisoul, 2016)



Em Praga, na praça Venceslau, a 16 de janeiro de 1969, quando se imolou Jan Palach ficou no ar a ideia de que a primavera morreria consigo. “E a verdade é que as coisas nunca mais foram as mesmas”, lembrava o pianista Karel Ruzicka há cerca de vinte anos, na mesma cidade, em conversa no clube de jazz Reduta. Cerrava os olhos pela ulcerada memória mas a verdade é que se deixava reanimar pelas transformações comportamentais que na capital checa decorriam desde a deposição do regime comunista. “No final da década de 60 chegámos a ter a liberdade mesmo à mão de semear. E isso percebia-se pelo que tocávamos. Aliás, quem quiser ter uma noção do significado exato da Primavera de Praga só tem de escutar os LP do período. Está lá tudo: o inconformismo, a esperança, a coragem, muita falta de vergonha na cara! Hoje essas coisas voltaram. Mas falta-lhes a música.” Perguntei-lhe por esses discos. “Olhe, nós podemos ter feito uma Revolução de Veludo, mas não se esqueça que a cortina era de ferro. Desapareceu tudo!” Como é óbvio, a frase ficou-me. Pelo menos tanto quanto a vontade de saber ao certo do que é que Ruzicka falava. É sobre isso que se tem paulatinamente levantado o véu, desde 2009, graças às compilações que Lukás Machata organiza para a Vampisoul e para a Munster (consagradas a Marta Kubisova, a Emil Viklicky, aos The Plastic People of the Universe, aos The Matadors ou aos Olympic), esse mundo há muito oculto de que este “Czech Up!” permite, enfim, uma visão panorâmica e mais abrangente, revelando verdadeiros achados, como são os de Flamingo, Discobolos, Golden Kids, Václav Tyfa e Mahagon. Ruzicka surge em dois temas: com a orquestra de Ferdinand Havlík, em 66, e com os Jazz Cellula, em 76. Com os primeiros faz o retrato de uma presa, com os segundos de um predador. Sinais do tempo.

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