21 de maio de 2016

Konono Nº1 “Konono Nº1 Meets Batida” (Crammed, 2016)



Dir-se-ia praticamente obsessivo, o prazer que Pedro Coquenão (luso-angolano que, de modo pouco menos de impúdico, assina com um nom de plume a que não deixa jamais de fazer jus) extrai desta singular matéria-prima subitamente colocada à sua disposição. O que, logo num momento inceptivo, justifica que “Konono Nº1 Meets Batida” se assemelhe já ao sucedâneo de remisturas que no seu horizonte mal se vislumbra. Ou seja, possui muito de redundante, este seu cruzamento, em Lisboa, com a presente encarnação do conjunto congolês (Augustin Mawangu, Pauline Nsiala, Menga Waku, Vincent Visi e Jacques Mbiyavanga). O que não se lhe leva a mal. Afinal, não terá sido o primeiro a deslumbrar-se no contacto direto com uma das raras expressões musicais do mundo acerca das quais nada mais se sabe do que aquilo que os seus praticantes permitem. Além de que é óbvio que colhe agora um tipo de consolo que a sua prática a sós não poderia prover. E, no entanto, nos segundos iniciais, com aqueles sons magnéticos extraídos às ferrugens dos likembes, com o progressivo ziziar de insetos arrancado às entranhas da floresta tropical e com a evocação subtil do típico encantamento canoro que, aí, nas copas das árvores, ao anoitecer se extravia, este disco aponta para um diálogo de atavio diverso. Mas é então que, numa relação pautada pela parceria e depois pela dominação, o produtor se deixa ir pela ladeira do seu instinto abaixo e cede ao oportunismo que há no ritmo, pronunciando-o com todos os acentos possíveis e imaginários, incapaz de domesticar as previsíveis epifanias que o impulso solta, estendendo construções que ultrapassam rapidamente o prazo de validade para que haviam sido programadas. E aqueles Konono Nº1 da crueza polifónica conduzida ao êxtase, da superação de códigos estéticos padronizados, dos processos mais radicais, simplesmente, evaporam-se. E não se chega a entender se desaparecem porque se querem perder ou se estão em busca de alguma coisa que não descobrem ou se permanecem sem nada procurar. Certamente que Coquenão sonda a sua própria consciência a respeito da forma como se geram, avançam, chocam e até convergem os caminhos da vida. Pouca dessa curiosidade vazou para aqui.

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