Tem
sido um quebra-cabeças, a música de Roy Nathanson ao longo dos últimos 30 anos.
Se fosse um quadro, e estivesse pendurada numa galeria, teríamos muito
provavelmente de inclinar o pescoço para um lado, e depois para o outro, a fim
de melhor a entender. Nessa medida, lembra a obra da artista plástica Jill
Nathanson, irmã do saxofonista – é dela a capa de “Implement Yourself”, dos
Jazz Passengers, a banda que Roy fundou em meados dos anos 80, com Curtis
Fowlkes, e pela qual foram passando vocalistas como Debbie Harry, Elvis
Costello, Mavis Staples ou Jimmy Scott. Aliás, numa sessão de terapia, seria até
interessante saber como reagiria ele, que é igualmente compositor, ator, poeta e
professor, a uma frase que Julie Salamon escreveu acerca de Jill, recorrendo a
um clichê da psicologia: “Durante muito tempo tentou conhecer o incognoscível,
como, por exemplo, a medida exata do sofrimento que conduziu a sua mãe ao
suicídio. O seu esforço ia no sentido de tornar o universo mais acessível, por
isso reduziu a escala da sua produção, de telas grandes e espalhafatosas até
peças mais pequenas de cores estranhas e variegadas que a faziam sentir-se bem consigo
mesma e que a levaram a acercar-se de qualquer coisa parecida com a esperança.”
Era uma forma de intimidade, aquilo de que porventura estaria à procura e é
disso que vem Roy agora falar em “Nearness and You”, também ele colocando de
lado o todo para mais efetivamente se concentrar na parte.
O mote, como é
óbvio, tem-no em ‘The Nearness of You’, canção imortal de Hoagy Carmichael e
Ned Washington a que tantos deram voz e que visita ao lado de Fowlkes, Arturo
O’Farrill, Myra Melford ou Marc Ribot, duetos registados em concerto, no Stone,
em junho de 2015. O seu modo de proceder recorda interrogações que,
precisamente a partir de um dos discos que Nathanson gravou com Anthony
Coleman, pianista que prontamente convocou para a semana de atuações aqui documentada,
levantou John Szwed, em “Crossovers”: “Como tocar jazz, quando a estrutura
social que lhe é subjacente já quase não existe ainda que se mantenha tão intimidante
a sua estética? Como interpretar melodias que evocam uma época capaz de gerar
ressentimentos? Uma das respostas da dupla é a de se tornar merecedora destes
temas graças ao trabalho de recomposição.” Ou seja, Roy (que, por sinal, faz 65
anos na terça-feira) nunca deixa de conjugar as suas múltiplas pertenças pela
ocultação das suas muitas insubmissões, inconformidades e contradições. Neste fascinante
registo cabem as suas dúvidas e descobertas, aquisições e alienações. Cabem as
memórias de uma vida.
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