Não só o
título é eufemístico, em ‘Funk With Me’, de Danny Offia & The Friks,
gravado em 1981, meses antes de Sylvester espalhar feromonas pelas pistas de
dança do mundo inteiro com ‘Do Ya Wanna Funk’: “She'll be comin’ round the
mountain, when she comes/ She'll be driving six white horses, when she comes”,
canta o nigeriano, de certo modo transferindo do foro escatológico para o
erótico a famosa adaptação popular de um velho hino protestante (‘When the
Chariot Comes’). Não foi o primeiro a fazê-lo, nem muito menos o último. E é
perfeitamente possível que se tenha deixado inspirar mais pelos Funkadelic de
‘Comin’ Round the Mountain’ (em “Hardcore Jollies”, 1976) do que pela exegese
cristã. Enfim, entre tantos outros, é um exemplo daquilo que terá levado o
organizador de “Doing it in Lagos”, Uchenna Ikonne, à seguinte reflexão: “Quase
nunca se falava do boogie-funk
nigeriano dos anos 80. E, quando se fazia, [percebia-se que] despertava nos
comentadores sentimentos de desconcerto, desconfiança e, até, desdém. Se é que
queriam, de todo, dizer alguma coisa, que significado teriam confeções tão
lustrosas, tão polidas? Será que se podiam verdadeiramente considerar ‘música
africana’ ou (como um crítico da época, com desconsideração, o colocou) não
passavam de ‘disco sound fonético’?”. Nada que a crónica do
rock nigeriano que o mesmo Ikonne escreveu para os dois volumes de “Wake Up
You! The Rise and Fall of Nigerian Rock” (Now-Again, 2016) não explique. Aliás,
esta compilação retoma a história da música popular do ‘gigante africano’ no
ponto exato em que a outra a deixou, relatando o declínio de um género tão
associado ao tempo da Guerra do Biafra que até mesmo os seus defensores mais
fervorosos estavam desejosos de o apagar dos respetivos currículos, de tal
forma o rock invocava desalinho, drama, destruição. Aqui, o disco sound foi mais do que cosmética:
foi o que permitiu que os nigerianos olhassem para o espelho sem ver de volta
refletidas as feridas que levavam na alma.
sources
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