5 de agosto de 2017

Roscoe Mitchell “Bells for the South Side” (ECM, 2017)


Cumpriu anteontem o seu 77º aniversário, Roscoe Mitchell, e não se pode dizer que lhe faltem razões para celebrar: assim por alto, teve novas peças estreadas pela Orquestra Sinfónica Escocesa da BBC e pela Orquestra do Teatro Comunale de Bolonha, viu este extraordinário CD surgir nos escaparates e, afinal, contrariamente ao que tinha sido indicado em junho, permanecerá à frente da cadeira Darius Milhaud em Composição do Centro de Música Contemporânea da Universidade de Mills, na Califórnia, posição que um plano de reestruturação financeira havia subitamente posto em causa. Reagindo a essa ameaça, tinha-se mantido algo fleumático: “Preocupam-me mais os meus dez colegas que se encontram na mesma situação que eu”, declarava ao “The New York Times”. “Não me afeta muito. Vou continuar como até aqui. Uma dura lição que há muito aprendi é que mais vale dar a volta a uma parede do que ir direitinho contra ela”, dizia desprendidamente ao “East Bay Express”. “Neste momento, se há coisa que me interessa fazer é aprender”, referia à estação de rádio “KQED”. Trata-se, no seu todo, de um conjunto de depoimentos muito revelador e que espelha a generosidade, a empatia e a curiosidade de quem o proferiu, assim como aquele distinto traço de carácter que encontrou na independência uma saída para a intolerância.

Cinquenta anos de criação musical – desde o embrionário “Sound”, de 1966 – descrevem-no na perfeição. E, hoje, escutar um dos seus discos, como este, permite aceder a esse ponto, raro, delicado e em contínua negociação, para o qual converge o sentido da vida, na sua expressão mais emancipada e ao mesmo tempo sensível à necessidade do outro, solitária e solidária. “Bells for the South Side” carrega algum desse contraste – e logo pelo título, que tanto pode evocar o luto causado pelo desaparecimento daquelas figuras agremiadas na zona sul de Chicago com que Mitchell formou os Art Ensemble (Lester Bowie, Malachi Favors) como o júbilo que esse mesmo encontro originou. Seja como for, está muito cheia da sua história, esta gravação captada no Museu de Arte Contemporânea da cidade e que tem como base o seu trabalho em trio (com James Fei e William Winant, Hugh Ragin e Tyshawn Sorey, Craig Taborn e Kikanju Baku e Jaribu Shahid e Tani Tabbal) e também o dos seus trios somados. Conforme cantou Raul Seixas em ‘Por Quem os Sinos Dobram”: “Nunca se vence uma guerra lutando sozinho”.

Sem comentários:

Enviar um comentário