Di-lo Val Xalino, e nos anos 80 não há quem não tenha
passado pelo mesmo numa qualquer discoteca africana em Lisboa: “As pessoas queriam
coisas diferentes, queriam dançar, queriam o sintetizador! Quando criámos este
novo som [refere-se à febre do cola-zouk
nas pistas crioulas] a música parecia dez vezes mais alta!” Xalino, com memórias
da famosa casa da Rua da Moeda, no Mindelo, que serviu de berço à morna, falava
a respeito do LP “Dançá Dançá T’Manchê”, de 1986, mas um ano antes tinha
cantado “Dilema d'Imigração”. O seu depoimento surge no livreto que acompanha
esta edição e que tem como maior virtude o discurso direto (Vik Sohonie,
organizador, entrevistou ainda Tchiss Lopes, Manuel Gomes, Jovino dos Santos e
Elísio Gomes), não obstante a mais-valia gerada por resumos biográficos da
autoria da investigadora Gláucia Nogueira ou por um competente ensaio saído da
pena do antropólogo Rui Cidra. Seja como for, é de emigração, sim, que se fala.
Ou melhor, daquele tempo (e a trajetória agora proposta peca por excesso, pois
o Nhô Balta de ‘Posse Bronck’, de 1973, não será bem para aqui chamado, e
simultaneamente por escassez, pois falta-lhe algum bife do lombo) em que se
iludiram os efeitos do perverso conjunto de limitações que reifica cronicamente
a precária condição. Como afirma Tchiss: “[Em Roma] via patrícios meus a dormir
na rua. A música foi uma salvação.” Daí o seu otimista “Stranger Já Catem
Traboi”. Foi sol de pouca dura, como se sabe, mas em nenhum lugar brilhou tanto
quanto na antiga sede de império, com paradigma no trabalho de Paulino Vieira (com
Voz de Cabo Verde, Abel Lima, José Casimiro ou Dionísio Maio), cujos sintetizadores
até os efeitos das bactérias nos foles dos velhinhos acordeões de funaná conseguiam imitar, como me confessou
um dia Toy, seu irmão. “Ouves blues e
soul, mas quando compões sai música
cabo-verdiana”, dizia Paulino (na foto) a Jovino, o que explica que só a custo se perceba
que o seu ‘Bo Ta Cool’ é na verdade uma versão de ‘Tell Me Why Has Our Love Turned Cold’, de Willie Hutch – Cabo Verde com um pé na Motown. Extensível a Pedrinho, Tulipa Negra e Cabo Verde
Show, que magnífico atrevimento.
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