Em “A Multitude of Angels” (a caixa que reunia
concertos seus de outubro de 1996, a solo, em Módena, Ferrara, Turim e Génova) praticamente ensaiava um dueto
com Annie Lennox: “O que me levou a seguir por diante e completar o meu
destino? Os anjos, que incluíam tudo à minha volta: as plateias, os pianos, a
doença, o DAT, o meu manager, a minha
mulher”, explicava, enquanto em seu redor se parecia ouvir os Eurythmics e “It’s
an orchestra of angels/ And they’re playing with my heart”. Agora, presta-se
atenção a este “After the Fall” e o que vem à memória é a canção homónima dos
Journey a servir de banda sonora às desilusões de Tom Cruise em “Negócio Arriscado”
quando, afinal, a vida dá mostras de não lhe vir a correr como o esperado e,
numa retórica descida aos infernos, ele se refugia na cave de sua casa e se põe
a brincar tristemente com o modelito ferroviário de quando era pequeno – claro
está, imediatamente antes de Rebecca De Mornay o conduzir ao paraíso a bordo de
um comboio a sério. Keith Jarrett não gera mais empatia do que isto.
Conta,
agora, em notas de apresentação: “Durante dois anos (do outono [Fall, em
inglês] de 1996 ao de 1998) padeci da Síndrome da Fadiga Crónica e não pude
tocar piano em público. ‘A Multitude of Angels’ contém a última música que fiz
antes de bater no fundo.” Pois então “After the Fall” regista a primeira que
fez quando se começou a sentir capaz de sair do buraco. Gravada ao vivo a 14 de
novembro de 1998, trata-se de uma sessão de fisioterapia num Reality show dedicado à crónica da vida
privada de um pianista de jazz. Dias antes, ao “The New York Times” de 8 de
novembro, dizia: “Estou numa fase algo imprevisível da minha recuperação. E
esta data em Newark vai ser a experiência mais arriscada de sempre [deste trio]”.
Mas Jarrett faz com os standards o
que Escher fazia com as figuras de “Relatividade”: coloca-os num espaço em que
as leis naturais não se aplicam, que é para que nem os que ficam de cabeça para
baixo se sujeitem a cair.
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