Cumpriu-se
na semana passada o centenário de nascimento de Leonard Bernstein e, como é
óbvio, acotovelam-se uns quantos caixotões nos escaparates: entre eles, o mais
recente será “The Vocal Works” (56 CD, Sony), que, por sinal, inclui a primeira
gravação desta “Missa”, com Alan Titus como celebrante. Mas há mais, claro,
entre os quais “An American in Paris” (7 CD, Warner), “Complete Works” (26 CD e
3 DVD, Deutsche Grammophon), “The Pianist” (11 CD, Sony) ou, remontando a 2017,
“The Composer” (25 CD, Sony) e “Remastered” (100 CD, Sony), embora, na verdade,
nenhum seja tão maciço quanto “The Complete Recordings on Deutsche Grammophon
& Decca” (com 121 CD, 36 DVD e 1 Blu-ray). Em respeito à convenção, além de
indigerível, como todo o alimento pré-confecionado, trata-se de um conjunto de ações
mais retrospetivo do que propriamente prospetivo e com pouco espaço para
revelações.
O que, de tanto escarafunchar na crosta do cânone, aliás, foi precisamente
o que tentou fazer Nézet-Séguin nesta sua produção da “Missa”, a começar pela
escolha de celebrante, o tenor Kevin Vortmann [na foto], com mais apetite pelos agudos do
que é costume no papel e de algum modo menos oracular nos graves, o que faz de
si um narrador ligeiramente mais humano e falhado, naturalmente mais real e, de
acordo com as exigências da obra, muito mais teatral – e a sua experiência em
musicais, bem como a de aqueles com que divide protagonismo, de Sarah Uriarte
Berry e Julia Burrows a E. Clayton Cornelious e Timothy McDevitt, aproxima-o do
ideal de Bernstein, mais convincente no palco do que no púlpito. Apesar de algo
desequilibrada, numa missa mais virada para os vivos do que para os mortos e
mais atraída pela irrisão anticlerical do que pela afetação eucarística, escutar,
na era Trump, uma quadra que se traduz livremente por “Metade desta gente anda
pedrada/ E a outra metade está à espera da próxima eleição/ Metade desta gente está
afogada/ E a outra metade está a nadar na direção errada” é já triunfo
suficiente.
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