Como
escreveu Ruy Castro em “A Onda Que Se Ergueu do Mar”, Johnny Alf (1929-2010)
foi daqueles destinados a viver “numa zona de sombra projetada pela sua própria
luz”. Até a biografia que lhe dedicou João Carlos Rodrigues é modesta,
recorrendo ao subtítulo “Duas ou Três Coisas que Você Não Sabe”, quando são às
dezenas, para não dizer às centenas, os factos acerca da sua vida que de modo
geral se ignoram. Por exemplo, que nas décadas de 60 e 70 ergueu um monumento em
cada ida a estúdio. Ou, como um dia disse, que a homossexualidade era a nuance que efetivamente evidenciava e
policiava o seu “comportamento junto às pessoas”, que era, numa alusão a ‘Eu e
a Brisa’, “a brisa do título da música”. Ou que jamais domesticou as suas
excentricidades enquanto compositor, anacrónico no antes e depois da época – a
da bossa nova – que melhor as reivindicou, conquanto fossem impossíveis de absorver
em absoluto. Alf interessava-se por decompor a realidade quando o tempo era de
síntese e em simplificá-la no instante em que se provava mais complexa. De
maneira invisível, administrou as ilusões de uma geração inteira num
determinado momento para de seguida lhe inventariar as desilusões. Disso fala este
álbum de 1971, pela primeira vez reeditado em CD na sua versão original e com um
EP de 1972 como complemento, em que todo o posicionamento político se vê
monopolizado por aspetos emocionais, em que a esperança não passa de um compromisso
intelectual e em que só o passado é autêntico e a solidão a única
inevitabilidade. Quem nunca o ouviu, desconhece toda a ingratidão que pode haver
no mundo e, de facto, não sabe duas ou três coisas sobre o amor.
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