20 de dezembro de 2014

Ustvolskaya: Violin Sonata; Clarinet Trio; Duet (ECM, 2014)




Patricia Kopatchinskaja (vln), Markus Hinterhäuser (p), Reto Bieri (cl)


Para Galina Ustvolskaya (1919-2006) havia algo de repudiável na análise teórica das suas obras. Nessa medida, era um pouco como aquelas puritanas matronas que ficam horrorizadas sempre que o passado das suas famílias vem a público. Tudo indica que tinha igualmente aversão a que a execução das suas peças ficasse entregue a mulheres, naquilo que um psicólogo daria como sinal de uma carência qualquer. Mas, já diz o provérbio, a palavras loucas, ouvidos moucos. E a este inefável CD de Kopatchinskaja a ECM acrescenta um livreto com vinte páginas a que só falta o essencial: dizer que não houve injustiça maior no retrato que ao longo dos anos se foi pintando da russa do que a que a caracterizou como uma compositora desprovida de ingenuidade. Isso, e que a repugnância pela ideologia e o desabraçar da utopia não ocultam o facto de que possui uma escrita diversa mas continuamente marcada pelo totalitarismo. Nem podia ser de outro modo, nem Shostakovich, o seu mentor, se entende exclusivamente à luz da pedagogia do oprimido. Mas é relativo saber-se que também Ustvolskaya alinhou, em dado momento, com os épicos triunfalistas do pós-guerra (ou era assim ou acordava com a polícia política a bater-lhe à porta a meio da noite). Nem que seja para melhor se valorizarem estas “Sonata para Violino e Piano” (1952), “Trio para Clarinete, Violino e Piano” (1949) e “Dueto para Violino e Piano” (1964) que ao culto bolchevique por novas formas de um Mayakovski, por exemplo, parecem responder com forma nenhuma. São profundas as estirpes do medo. Aqui, algures entre Messiaen e Feldman, escavam-se-lhes as raízes.

Sem comentários:

Enviar um comentário