Patricia Kopatchinskaja (vln), Markus Hinterhäuser
(p), Reto Bieri (cl)
Para Galina Ustvolskaya (1919-2006)
havia algo de repudiável na análise teórica das suas obras. Nessa medida, era
um pouco como aquelas puritanas matronas que ficam horrorizadas sempre que o
passado das suas famílias vem a público. Tudo indica que tinha igualmente aversão
a que a execução das suas peças ficasse entregue a mulheres, naquilo que um psicólogo
daria como sinal de uma carência qualquer. Mas, já diz o provérbio, a palavras
loucas, ouvidos moucos. E a este inefável CD de Kopatchinskaja a ECM acrescenta
um livreto com vinte páginas a que só falta o essencial: dizer que não houve injustiça
maior no retrato que ao longo dos anos se foi pintando da russa do que a que a
caracterizou como uma compositora desprovida de ingenuidade. Isso, e que a
repugnância pela ideologia e o desabraçar da utopia não ocultam o facto de que
possui uma escrita diversa mas continuamente marcada pelo totalitarismo. Nem
podia ser de outro modo, nem Shostakovich, o seu mentor, se entende
exclusivamente à luz da pedagogia do oprimido. Mas é relativo saber-se que também
Ustvolskaya alinhou, em dado momento, com os épicos triunfalistas do pós-guerra
(ou era assim ou acordava com a polícia política a bater-lhe à porta a meio da
noite). Nem que seja para melhor se valorizarem estas “Sonata para Violino e
Piano” (1952), “Trio para Clarinete, Violino e Piano” (1949) e “Dueto para
Violino e Piano” (1964) que ao culto bolchevique por novas formas de um
Mayakovski, por exemplo, parecem responder com forma nenhuma. São profundas as
estirpes do medo. Aqui, algures entre Messiaen e Feldman, escavam-se-lhes as
raízes.
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