25 de julho de 2015

Xanadu Master Edition Series (Elemental, 2015)


[Albert Heath “Kwanza (The First)”; Barry Harris “Plays Tadd Dameron”; Jimmy Heath “Picture of Heath”; Al Cohn & Jimmy Rowles “Heavy Love”; Sam Most “From the Attic of My Mind”; Al Cohn, Billy Mitchell, Dolo Coker, Leroy Vinnegar, Frank Butler “Night Flight to Dakar” + “Xanadu in Africa”]
 
Dentro da cinta murada de Xanadu, segundo Marco Polo, um faustoso palácio de mármore envolvia-se em mantos frondosos e lençóis de água fresca. Recheada de riquezas, era a capital de verão de Kublai Khan e o mais literal dos modelos históricos para quem crê que a casa de um homem é o seu castelo. De modo crucial, para Don Schlitten, também assim que se chamava a mansão de Charles Foster Kane em “O Mundo a Seus Pés”, de Orson Welles. “Por isso, tem sido um nome que associamos à beleza artística e à felicidade”, diz agora o produtor a Zev Feldman, da Elemental, lembrando o batismo da empresa que fundou em meados dos anos 70 e, de certa maneira, abençoando a corrente operação de resgate. Porque a verdade é que parte deste património estava em risco de se perder. Aliás, sem entrar em pormenores, Feldman conta como muitas das matrizes fonográficas e fotográficas da editora se destruíram à passagem do furacão Sandy, em 2012.

Era uma iniciativa há muito devida. Afinal, no mercado discográfico norte-americano do período, a par de contemporâneas como a Mainstream ou a Muse – com a qual Schlitten colaborou –, a Xanadu revelou-se um destino fundamental para o jazz que fez a creche no bebop. De todas, pese embora Peter Sprague, foi até a que menos pôs o pé no esoterismo e a que mais resistiu a modas, com Sam Noto, Sonny Criss, Al Cohn, Charles McPherson, Jimmy Raney, Barry Harris ou Sam Most firmando-lhe a reputação. O flautista, por exemplo, conforme confessava em “Sam Most, Jazz Flutist”, um documentário de 2001, tinha já “caído em esquecimento”. Só de originais, “From the Attic of My Mind”, de 1978, é um exponencial exercício de controlo idiomático. No filme declarava ter telefonado a Schlitten averiguando acerca da disponibilidade em CD destes discos, tendo-lhe respondido o produtor: “Vivamos nós o suficiente para o ver”.

Como Most, também Al Cohn e Jimmy Rowles se foram antes da reedição de “Heavy Love”, uma das pérolas do catálogo. Se “As Cidades Invisíveis”, de Italo Calvino, um livro baseado nas conversas entre Polo e Khan, representa em diálogo a arquitetura da imaginação, estes duetos de 1977 não fazem por menos. Com a medida certa de escuro e a dose exata de claro, outro clássico na Xanadu é a investida de Barry Harris na dameronia, de 1975, cumpriam-se então dez anos sobre a morte do dedicatário. Trata-se de uma arte em que tudo se transforma, afirmava Jimmy Heath. O seu “Picture of Heath”, de 1975, é disso mesmo um retrato, ao regressar ao passado e ao incluir um antitético mas não menos holístico ‘Body and Soul’, em que a parte do corpo é tocada ao saxofone soprano e a da alma no tenor. “Kwanza”, do caçula dos Heath, em 1973, narrava uma estória dentro de outra e tinha a mente em África, ainda que “Tootie” tornasse de uma temporada europeia. Até solo africano conduziu Schlitten uma comitiva em 1980, resultando daí um par de álbuns que neste lote se incluem por razões puramente simbólicas. É longo o caminho para Xanadu. Venham as próximas paragens.

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