30 de julho de 2016

Granada: 1013-1502 (Alia Vox, 2016)



Estende-se até 1502, a cronologia deste programa concebido por Jordi Savall para assinalar o milenário de Granada (1013-2013). Como é óbvio, a data é a da famosa Pragmática dos Reis Católicos, que, sob pena de saída forçada, ordenava a conversão dos muçulmanos do reino. Claro que Savall poderia ter fixado essa baliza temporal em 1609, quando Filipe III de Espanha decretou a expulsão dos mouriscos. Mas a verdade é que, se quisesse, não lhe faltariam motivos para ir dilatando indefinidamente os prazos do seu projeto. Isto, porque, salvo raras exceções, fala de uma sensibilidade que se tem vindo a deixar blindar pela intolerância até hoje. Talvez por isso termine o disco de modo anacrónico: à leitura de um texto sobre os acontecimentos de 1502 segue-se “Maqam Hijaz”, um lamento andaluz de Ibn Zaydún, poeta do século XI. A escolha não será inocente nem tampouco o é a opção de o ver interpretado por Waed Bouhassoun e Lior Elmaleh, uma síria e um israelita. Assim, aqueles versos finais (“Quando te ausentas abandona-me o mundo inteiro/ E quando voltas todo ele está presente”) não são tanto os do famoso Monumento aos Namorados, em Córdova, edificado para lembrar a história de amor entre Zaydún e Wallada, quanto a prova do desconsolo de todos os que já experimentaram a saudade e o exílio.

Savall faz 75 anos esta segunda-feira, dia 1. Numa entrevista à francesa “L’Express” mostra-se “consciente de estar a entrar numa fase crepuscular”. Referindo-se à crise de refugiados na Europa, declara que “o drama está bem à nossa porta e ninguém o quer admitir”, mas que “sem reconhecimento não há reconciliação”. De certa forma, neste “Granada”, que vai dos ziridas e dos almorávidas até aos almóadas e aos nasridas, não fala de outra coisa. E, no entanto, seja a interpretar música arábico-andaluza, cristã (das “Cantigas de Santa Maria” e do “Códice de Las Huelgas”) e judaica ou sefardita, e citando Canetti, insiste sempre na “música enquanto história viva da humanidade”. Nessa perspetiva, traz à memória o mourisco Ricote, do “Dom Quixote”, que, como concluiu Ruth Fine, provava que “no mundo cervantino, o pior erro não consiste na falsa interpretação da realidade e sim no não-reconhecimento do outro e no não-reconhecimento do outro em nós mesmos.” Um erro que Savall quer ver corrigido.

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