Em
março de 1977, em declarações à revista “Veja”, Tim Maia, esse infatigável
paladino do eufemismo, dizia assim: “Faço música de preto. E os pretos precisam
se convencer de que chegaram ao mundo dos brancos acidentalmente, em navios
negreiros. Olha só isso que chamam de movimento Black Rio: os negros
[brasileiros] não passam de xérox dos [negros] americanos, que, por sua vez,
imitam os brancos. Não sacam que o negócio é voltar para a África.” Assentindo
e batucando com cabeça, tronco e membros, por exemplo, estava o conjunto Alma
Brasileira, que, no álbum “Samba Marca Registrada Brasil”, a certa altura
cantava: “Eu vou voltar para a Angola/ Angolê, Angolá”. Aliás, quem tinha
voltado a – e de – África era Gilberto Gil, convidado a participar no Festac
’77, na Nigéria, e pertencem-lhe alguns dos versos mais significativos do
período: “Somo criôlo doido/ Somo bem légau/ Temo cabelo duro/ Somo black pau”,
proclamava de modo fonético e algo messiânico em ‘Ilê Ayê’, um dos temas de
“Refavela”.
Na altura, houve quem denunciasse Gil utilizando os mesmos
argumentos com que em 1940 se havia condenado Carmen Miranda – só faltou o
baiano defender-se com um sambinha intitulado ‘Disseram que Voltei Africanizado’.
Na verdade, foi preciso aguardar um par de anos: “[A imprensa] caiu de pau em
cima por causa da atitude do disco, que era black. E eles na época estavam
todos contra black – não contra negro, mas contra black, a consciência que vem
e que é internacional e está ligada a tudo e não é uma coisa brasileira só”,
explicava ele ao “Jornegro”, em 1979. Pois, em 1977, essa consciência ficou
plasmada numa série de lançamentos importantes mas comercialmente falhos: em
“Maria Fumaça”, da Banda Black Rio, em “Pra que vou Recordar”, de Carlos Dafé,
em “Nossa História de Amor”, de Hyldon, e nos discos homónimos de Robson Jorge,
Gerson King Combo e União Black, que, em ‘A Vida’, exaltava: “Ser black, cantar
alegre e unido/ Lutando, o nosso som é uma luta/ É suingue, sentimento, força
bruta”. Estavam a querer ensinar a missa ao padre. E Tim, neste LP, respondeu:
‘Pense Menos’ e ‘Não Esquente a Cabeça’. Não era a exortação que se esperava,
mas como expoente do funk, no Brasil,
deu para arrumar com a concorrência.
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