Tratar-se-á, este, de um ciclo tão irracional e ininterrupto
quanto essoutro que nos faz desejar seguir um ente querido para o além? Tome-se
o final de “Blues People”, de Amiri Baraka, lançado em 1963: “Não é segredo
para ninguém que o Ocidente se acha agora na posição de ter de proteger os seus
valores e ideais contra sistemas que lhe são totalmente hostis. E que ao negro
norte-americano está a ser pedido que se engaje nessa defesa. (…) Mas na sua mente
há uma interrogação (o que explica o poder de atração de grupos islâmicos): o
que é, ao certo, que lhe está a ser pedido que salve? É uma pergunta legítima,
e é bom que a América encontre resposta.” Pouco depois, logo que Baraka fundou a
Jihad Productions, era óbvio que a questão continuava por resolver. Mas meio
século mais tarde, nas suas notas de apresentação deste “Wiring”, publicadas
postumamente, fica mais clara a simples ideia de outrora: esta música, que mais
não é do que uma aparição num mundo em que erradamente se separa o poético do
didático, serve para que se ganhe consciência de que uma sociedade se define
também pela ação dos que coloca à sua margem. De acordo com tal premissa,
Oliver Lake, Reggie Workman, Andrew Cyrille e Vijay Iyer dedicam aqui uma suíte
a Trayvon Martin (“e a milhares como ele”), aquele acerca do qual, quando
morto, Obama afirmou: “Podia ter sido eu há 35 anos”. Ou seja, só a má-fé revelará
neste álbum – feito de jazz até ao tutano – o mesmo que foi sempre detetado em toda
a arte livre: que, de algum modo, há algo de artificial no impulso que leva um
homem a querer compreender outro diferente de si. Seja esse o ciclo que não se
quer ver quebrado.
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