8 de agosto de 2015

Henry Threadgill Zooid “In for a Penny, In for a Pound” (Pi Recordings, 2015)



Wadada Leo Smith fala com relutância de Henry Threadgill, como um tímido que tenha subitamente de revelar alguma coisa acerca de si mesmo. “Há tanto que partilhamos”, reconhece. “Interessamo-nos por um assunto e exploramo-lo até à exaustão, como que mergulhados num sonho. E o que daí resulta está impregnado de informação: cultural, científica, biológica, psicológica. Mas não se trata de música programática. Vive unicamente no momento em que está a ser executada e, aí, está em permanente transformação.” É portanto mais antiga do que o que parece e, ao mesmo tempo, muito mais recente do que aquilo que pode efetivamente ser. A declaração surge no contexto de uma conversa que tem “The Great Lakes Suites” como tema. Talvez por isso Wadada se furte a mais explicações, logo remetendo para o poema que dedicou a Threadgill e que esse seu CD reproduz. Eis uns versos: “O seu espetro tonal/ uma rica e luxuriante tela de unidades melódicas culturalmente saturadas” ou “E todos o conheciam como o autor dos sonetos para saxofone”. Neste seu novo álbum Threadgill não faz referência a sonetos mas menciona “épicos”. Por sinal, embora não o tornando explícito, através de composições (‘Ceroepic’, ‘Unoepic’, etc.) em que se reconhecem vagas latências latino-americanas ou, pelo menos, a tração do trânsito transatlântico. De maneira absurda traz até à memória que o mais inspirado nome entre a ordem dos zooides é o da caravela-portuguesa. Pois neste “In for a Penny, In for a Pound” pressentem-se as folgas das formas afro-cubana e afro-brasileira, a toada do tango, a flamância do flamenco, o meneio da morna e o arrepio de muitas aliterações mais. Em comum com modalismos hispânicos possui ainda relações intervalares, o atropelamento dos ritmos ou a rigorosa obediência ao contraponto, mas, também, aquelas melodias que se diriam imitar o grito de uma arara a irromper por uma vereda. É uma morada morena para a música mestiça. E, porventura, entre a música de câmara (esta para a tuba ou trombone de Jose Davila, a percussão de Elliott Kavee, o violoncelo de Christopher Hoffman e o violão de Liberty Ellman, além do saxofone e da flauta do compositor), a mais radicalmente estimulante a chamar a si um certo “artesanato furioso” desde que Boulez escreveu “Le Marteau sans maître”.

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