O grupo Cormoran fala-nos de exílio e emigração,
mas também de intervenção e integração; Hervé Imare lança um apelo à
solidariedade entre os povos; Vivi canta sobre a necessidade de um acordar coletivo,
enquanto os Caméléon, de Alain Péters e Loy Ehrlich, fazem a denúncia do
individualismo – de facto, não admira que um disco absolutamente emblemático do
período (de 1982, o “La vie est un mystère”, dos Carrousel) tenha saído para as
ruas já de punho erguido no ar, com a chancela da Édiroi (Éditions Reúnion
Océan Indien), a editora do Partido Comunista da Reunião. Era uma fase em que,
visto ao ecrã de um computador, no mapa-múndi, até a este píxel morto a leste
de Madagáscar chegavam ventos de mudança, em que agentes ao serviço de uma identidade
com raiz no paradoxo (a da cultura crioula, há muito corrompida e exaurida pela
administração francesa) procuravam superar antagonismos sociais herdados do passado
através de um conjunto de manifestações que, como na altura se dizia, evidenciavam
uma revolta profunda contra as atividades ideológicas e artísticas dominantes. Foi
a era da maloya-fusion, em que a própria música tradicional reunionense sofria um despertar
político e poético, estimulada pela cafeína extraída ao jazz elétrico, à pop
psicadélica ou ao rock progressivo. De tal maneira que aquela insólita coleção
de idiofones e membranofones insulares (o roulèr,
o pikèr, o kayamb ou o bobre) se via
substituída por caixotes do lixo, chapas, baldes de tinta e vasos. Como um
crítico mais edipiano poderia ter dito, o folclore do papá estava efetivamente morto.
Aliás, ressentida pela forma em como a sua música mais subversiva adquiria um
caráter institucional, num número da revista “Le rideau de cannes”, em Paris, a
UGECR (União Geral de Estudantes Crioulos da Reunião) condenava o regime por
“trazer para a luz do dia esta cultura da noite”. Apesar da UNESCO a ter
entretanto arrumado no frigorífico do Património Imaterial (que prolonga a vida
mas retira a frescura), ali, entre os anos 70 e 80, ela voltou a ser das
sombras. E é de lá que agora regressa, espumando pela boca.
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